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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2007 Harlequin Books S.A. Todos os direitos reservados.

DESTINOS DIVIDIDOS, Nº 56 - Novembro 2013

Título original: Surgeon Prince, Ordinary Wife

Publicada originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Publicada em português em 2008

 

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

™ ® Harlequin y logotipo Harlequin são marcas registadas por Harlequin Enterprises II BV.

® e ™ São marcas registadas pela Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas que têm ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-3789-8

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

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Regras da Casa Real de Niroli

 

1ª regra: O soberano deve ser um líder moral. Se o pretendente ao trono cometer um acto que ponha em causa o bom-nome da Casa Real, será afastado da linha sucessória.

2ª regra: Nenhum membro da Casa Real poderá contrair casamento sem o consentimento do soberano. Se o fizer, ser-lhe-ão retiradas honras e privilégios, e será excluído da família real.

3ª regra: Não se autorizarão os casamentos que vão contra os interesses de Niroli.

4ª regra: O soberano não poderá contrair casamento com uma pessoa divorciada.

5ª regra: É proibido que membros da Casa Real com relação de consanguinidade contraiam casamento entre eles.

6ª regra: O soberano dirigirá a educação de todos os membros da Casa Real, embora o cuidado geral das crianças corresponda aos pais.

7ª regra: Nenhum membro da Casa Real poderá contrair dívidas que superem as suas possibilidades de pagamento sem o conhecimento prévio e aprovação do soberano.

8ª regra: Nenhum membro da Casa Real poderá aceitar doações nem heranças sem o conhecimento prévio e aprovação do soberano.

9ª regra: O soberano deverá dedicar a sua vida ao reino de Niroli. Portanto, não lhe é permitido o exercício de nenhuma profissão.

10ª regra: Os membros da Casa Real deverão residir em Niroli ou num país que o soberano aprove. O monarca tem a obrigação de viver em Niroli.

Um

 

Se não fosse tão tarde, não teria ido por aquele atalho.

Amelia praguejou e tentou libertar-se da roseira onde ficara presa ao subir pela grade das traseiras. Era a sua última visita do dia.

— Afinal, a lenda é verdadeira — disse uma voz masculina, que vinha de trás. — Há fadas no fundo do jardim.

Amelia virou-se. Um homem alto observava-a de baixo. Mal conseguia disfarçar a gargalhada. Tinha um ar italiano. Pele morena, cabelo preto... E, no entanto, o sotaque parecia norte-americano ou britânico, Amelia não tinha a certeza. Usava uma camisa e umas calças de marca italiana. Os botões superiores da camisa estavam desabotoados e deixavam entrever um peitoral musculado.

— Esta é a sua casa? — perguntou ela, puxando a saia para se libertar.

— Não — disse ele. — Só a arrendei por algumas semanas, mas o proprietário não me falou dos extras do jardim. Devia ter-me cobrado mais. Eu teria pago sem regatear.

Amelia sentiu uma onda de calor nas faces e franziu o sobrolho sem deixar de puxar a saia.

O desconhecido esboçou um sorriso e olhou para ela de cima a baixo.

— Bom, acho que me precipitei. Não é uma fada. Parece mais um duendezinho.

— Bom, na verdade sou enfermeira e já estou atrasada para a minha próxima visita ao domicílio — resmungou ela. — E se você ou o seu caseiro cuidassem melhor do jardim, eu não estaria aqui presa.

Ele cruzou os braços e começou a balançar-se sobre os calcanhares. Os seus olhos brilhavam com malícia.

— E se você não tivesse irrompido na minha propriedade, não teria ficado presa nesse matagal.

Amelia fulminou-o com o olhar e puxou a saia com raiva, mas a única coisa que conseguiu foi rasgar o tecido e deixar a descoberto parte da coxa.

— Se voltar a puxar essa saia, vai fazer-me corar.

— Importa-se de me deixar sozinha? — perguntou, irritada. — Preferia não ter público neste momento.

Ele tapou os olhos com as mãos.

— Prometo não olhar.

Amelia soltou um sopro e continuou a lutar com a saia. Sentia os olhos do desconhecido cravados na pele.

Finalmente, conseguiu libertar um lado da saia e virou-se para um prego no qual também ficara presa.

— Já posso olhar? — perguntou ele.

— Não — disse Amelia e deu outro puxão à saia.

Então, ouviu o tecido rasgar-se e, antes de poder reagir, acabou nos braços daquele homem.

— Oh! — exclamou a jovem, ao cair.

— Meu Deus! — exclamou ele, com um sorriso atrevido. — E eu que pensava que não voltariam a perder as saias por mim!

Amelia tentou tapar-se com o que restava de tecido.

— Por favor, ponha-me no chão! — exclamou, tentando controlar-se.

O rosto dele estava tão perto que podia ver as suas pupilas pretas. Tinha uma barba de dois dias, mas o cheiro frutado do seu aftershave ainda se misturava com uma fragrância embriagadora almiscarada, masculina...

Ele colocou-a, lentamente, no chão.

— Bom, agora vire-se e deixe-me dar uma olhadela.

Amelia ficou petrificada. O ar circulava por onde não devia fazê-lo e, para cúmulo, usava umas cuecas horríveis.

— O que se passa? — perguntou ele. — Ah! — exclamou, ao vê-la olhar para a grade.

Ela reprimiu uma expressão de raiva ao vê-lo ir para a grade. O desconhecido arrancou o que parecia ser a parte de trás da saia do prego. Voltou e entregou-lha com um sorriso brincalhão.

— Receio que vá precisar de alguns pontos.

— Não é assim tão grave — disse ela, recuando.

Com grande dificuldade, enfiou o farrapo por dentro do elástico da cintura da saia.

— Quer que a ajude a subir a grade? — ofereceu-se.

— Não, obrigada. Darei a volta — ela respirou fundo, apanhou a mala e seguiu em frente sem largar a saia.

— Não me disse o seu nome — disse ele. — Deixe-me adivinhar... Sininho?

Ela virou-se e cravou-lhe um último olhar.

— Não precisa de saber o meu nome, não voltará a ver-me por aqui.

— Que pena! Eu gostava da ideia de ter um duendezinho.

Ela seguiu em frente, mas o som das suas gargalhadas acompanhou-a até à casa da senhora Gravano.

 

 

— Parece que atravessaste um matagal — disse a idosa, ao abrir a porta.

— Quase — disse Amelia, fazendo uma careta ao olhar para a sua saia maltratada.

— Voltaste a vir pelo atalho?

— Sim, infelizmente! — olhou para a senhora Gravano, com cumplicidade. — Conheci o novo inquilino.

— Ah, o médico! Mudou-se esta manhã.

Amelia levantou a vista.

— Quem?

— O médico australiano — disse a senhora Gravano. — Pensei que sabias. Trouxeram o doutor Alex Hunter para Niroli para cuidar do rei. Ele ofereceu-se para trabalhar com o pessoal do Free Hospital, para criar uma nova unidade de cardiologia.

— Mas só devia vir no fim da semana que vem — disse Amelia.

Virou-se para lavar as mãos e disfarçar o seu transtorno.

— Suponho que antecipou a viagem para desfrutar do bom tempo, antes de começar a trabalhar — disse a idosa, enquanto punha o pé num banco, para que Amelia o examinasse. — É muito curioso, não achas?

— Curioso? — perguntou Amelia, confusa. — O que quer dizer?

— Parece tão italiano, que qualquer um diria que nasceu na ilha.

A jovem voltou a franzir o sobrolho e virou-se para a mala, para tirar as ligaduras que trouxera.

— Pelo seu sotaque, pareceu-me britânico.

— Recebeu uma educação excelente, claro! Acho que deu conferências no mundo inteiro, para dar a conhecer esta nova técnica.

— E, então, porque arrendou aquela casa em ruínas? O lógico seria que ficasse em Santa Fiera, onde estão o casino, os hotéis e os restaurantes.

— Suponho que prefere estar perto do hospital e da parte antiga da ilha. Além disso, só vai estar cá um mês e talvez queira desfrutar de um ambiente mais rural e verdadeiro. A cabana não está assim tão mal. Só é necessário limpar o jardim.

Amelia não foi capaz de imaginar o cardiologista com um ancinho na mão.

— E o que te pareceu? — perguntou a senhora Gravano.

Amelia franziu os lábios, enquanto lhe tirava a ligadura.

— Pareceu-me... Eh...!

A senhora Gravano desatou a rir-se.

— É muito bonito, o suficiente para fazer uma mulher suspirar. Não é assim, Amelia? Ainda bem que é cardiologista. Já deve ter destroçado muitos corações.

— Sim, bom. Não vai destroçar o meu — disse ela, com convencimento.

— Passaste demasiado tempo com as freiras. Eu sempre pensei que a emenda seria pior do que o soneto, quando te enviaram para aquele convento, depois da morte da tua mãe. És demasiado jovem para te consagrar aos outros, sem teres vida própria.

— Eu tenho vida própria.

— Chamas vida a isso? A viveres ao pé da montanha como uma camponesa, a limpares o que o teu pai e os teus irmãos sujam? Devias sair e desfrutar como as pessoas da tua idade. Trabalhas demasiado, Amelia. Demasiado!

— Não será para sempre. Tenho um novo emprego, começo amanhã — Amelia endireitou-se e prosseguiu. — O rei precisa de uma enfermeira durante dois dias por semana e consegui o emprego. Consigo conciliá-lo com o meu trabalho no Free Hospital.

A senhora Gravano arqueou os sobrolhos.

— E o que pensa o teu pai de trabalhares para o rei Giorgio?

— Não lhe disse... ainda.

— Ainda bem. Como bom republicano, não acho que goste de te ver a servir no palácio de Niroli.

— Tenho trinta anos, signora Gravano — disse Amelia. — Tenho idade suficiente para trabalhar onde quiser sem o consentimento do meu pai e dos meus irmãos... Além disso, não acho que o meu pai viva muito mais tempo.

— Como está?

Amelia suspirou.

— A piorar, embora ele se recuse a admiti-lo. Não quer ir ao hospital e não deixa que ninguém vá visitá-lo. E que médico se incomodaria em ir vê-lo para nada? Eu faço o que posso, mas receio que não lhe reste muito tempo.

— E não consegues convencer os teus irmãos a ajudarem-te?

— Eles ajudam-me quando podem, mas têm os seus próprios problemas. Não é fácil ser um Vialli na ilha de Niroli. As pessoas não esquecem.

— Então, as coisas não podiam estar piores — disse a senhora e os seus olhos entristeceram-se. — Felizmente, ainda não tinhas nascido. Havia muita violência, ódio... Derramamento de sangue.

— Eu sei... — Amelia voltou a suspirar. — O meu pai nunca o superou.

— Muitos acham que ele também merecia morrer.

Amelia não respondeu, mas gelou-lhe o sangue.

— Não te demoro mais — disse a senhora Gravano, com um sorriso. — És uma boa rapariga, Amelia. A tua mãe estaria orgulhosa de ti.

Amelia inclinou-se e deu um abraço à idosa.

— Obrigada.

— Porque não me deixas a saia para que eu ta arranje? Podes vestir algo da minha filha. Ainda tem roupa no armário para quando fica comigo.

— Não quero ser um incómodo.

— Não és um incómodo. És mais baixa do que ela, mas, pelo menos, chegarás a casa sem morreres de vergonha. Nunca se sabe com quem te cruzarás pelo caminho. O que pensariam, se te vissem vestida como uma cigana?

Alguns minutos depois, Amelia olhou para o vestido enorme que vestira e perguntou-se como iria a pé até ao hospital com um calor tão asfixiante. O seu irmão Rico pedira-lhe o carro emprestado e combinara com ela no hospital.

Com a cabeça baixa e a toda a pressa, passou diante da casa do médico visitante.

De repente, um carro desportivo flamejante contornou a curva e Amelia afastou-se para não ficar coberta de pó. Em vez de seguir em frente, o veículo parou ao seu lado.

— Olá, Sininho! Estou a ver que vestiste algo mais cómodo.

Amelia ficou tensa. Saltavam faíscas dos seus olhos.

— Suponho que é o médico australiano de que estávamos à espera. Que pena que não lhe tivesse ocorrido apresentar-se devidamente, quando teve ocasião!

Ele desligou o motor e saiu do carro.

— Você também não me disse o seu nome, portanto não tinha de lhe revelar o meu — replicou, com malícia. — É justo. É o meu primeiro dia na ilha. Hoje em dia, é preciso ter cuidado. Você poderia ser uma criminosa perigosa.

Ela ficou a olhar para ele e perguntou-se se teria ouvido algo sobre a sua família.

— Mas não é — inclinou-se para ela e atravessou-a com o olhar. — Pois não?

Amelia recuou e esteve prestes a cair.

— O... o quê?

— Uma criminosa perigosa.

— Já... Já lhe disse. Sou enfermeira.

Ele olhou para ela de cima a baixo.

— Uma enfermeira à paisana. Está disfarçada?

— Não uso uniforme quando faço as visitas ao domicílio, para que os pacientes não se sintam tão incomodados.

— Trabalha no Free Hospital?

— Sim.

— Em que departamento?

Ela fez uma careta.

— No de cardiologia.

— Bom, então vamos ser colegas! — anunciou ele, com alegria.

— Assim parece.

Ele fez o seu melhor sorriso.

— Então, vai dizer-me como se chama ou continuarei a chamar-lhe enfermeira Sininho até se ir embora?

— Amelia Vialli — resmungou.

— Alex Hunter — disse ele e apertou-lhe a mão. — Tudo bem?

Amelia tentou libertar-se, mas não a largava. Então, olhou fixamente para ele e ele desatou a rir-se.

— Não queres que te arranque o braço, pois não?

— Os australianos são todos tão chatos ou tu tiveste aulas particulares? — perguntou-lhe, afastando bruscamente a mão. — Certamente, atribuíram-te uma menção honrosa.

— E os habitantes de Niroli são todos tão desagradáveis ou és só tu?

Amelia franziu o sobrolho, zangada.

— Não estou a ser desagradável.

Ele voltou a sorrir.

— Não queria ver-te zangada.

— Desculpa — disse Amelia e fez menção de partir. — Estão à minha espera.

Ele parou-a, agarrando-a pelo braço.

— Queres que te leve?

Amelia olhou para ele por cima do ombro e afastou-se bruscamente.

— Não, obrigada.

— Vais a pé com esse vestido?

— Sim! — respondeu-lhe, com expressão desafiante.

— Queres fazer horas extraordinárias como varredora ou algo do género?

Amelia semicerrou os olhos, levantou um pouco a saia e pôs-se a andar para a vila.

Alex ficou a olhar para ela, com um esgar de sorriso nos lábios.

— Que bonito! — exclamou em voz alta.

A brisa trazia o cheiro das flores de laranjeira. Alex fechou os olhos e respirou fundo, desfrutando do ar fresco da Primavera, depois do longo voo desde Sidney.

Um mês inteiro na bonita ilha mediterrânica de Niroli, convidado pelo rei, nem mais, nem menos...

Sem dúvida, teria muito trabalho, mas, com um pouco de sorte, teria tempo para desfrutar das praias e da vida nocturna. Talvez pudesse dar um passeio até à cratera do vulcão.

Abriu os olhos e voltou a ver a figura rígida que já chegara quase ao fim da rua. Um carro velho parou no cruzamento e um tipo desmazelado abriu a porta do acompanhante.

Alex respirou fundo e seguiu o carro com o olhar até o perder de vista.

— Parece que não estás com sorte... — disse e foi para o seu desportivo.

Sentou-se ao volante e arrancou a toda a velocidade.