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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

© 2010 Cara Colter. Todos os direitos reservados.
NOIVO EM DEZ ENCONTROS, Nº 370 - Março 2011
Título original: Winning a Groom in 10 Dates
Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.
Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.
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I.S.B.N.: 978-84-671-9567-5
Editor responsável: Luis Pugni

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Noivo em dez encontros

Cara Colter

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Prólogo

– Estou a ver que abandonaste o estilo hippy, Sheridan, o cabelo comprido, a barba, o brinco...

– Sim, senhor – respondeu Brand, que vivera na clandestinidade durante tanto tempo, que tinha dificuldade em responder quando o chamavam pelo seu verdadeiro nome.

– Já não precisas de te parecer com ele – disse o seu chefe, com um ar de satisfação. – Brian Lancaster está morto. Fizemos com que tudo parecesse como se o seu avião privado tivesse caído no Mediterrâneo por causas desconhecidas. Nenhuma das pessoas que restaram da operação Lobby estará a perguntar-se porque é que o senhor Lancaster não foi um dos vinte e três detidos em sete países diferentes. Bom trabalho, Sheridan. Nenhum de nós poderia ter imaginado isto quando respondeste àquele anúncio na Internet. Deste uma nova projecção à brigada.

A Brigada de Emergência para a Erradicação do Te rrorismo era uma unidade formada por homens muito bem treinados e com um grande sentido da disciplina. Brand, recrutado mesmo depois da sua primeira missão nos marine, demonstrara tal coragem e heroísmo que o tinham promovido como um dos melhores especialistas em resgates de escalada de alto risco. Essa qualidade, aliada à sua facilidade para as línguas, levara-o a entrar na brigada.

A sua resposta na Internet a uma página europeia que oferecia a compra de armas estratégicas de uso restrito mudara tudo. Brand vira-se, da noite para o dia, imerso num mundo perturbador, onde era em parte polícia, em parte soldado e, em parte, agente e espião.

Mas tinha de pagar um preço. Para dizer a verdade, Brand preferia as missões mais difíceis, em que tinha de pôr em jogo a inteligência e não só as grandes doses de coragem e preparação física que desenvolvera ao longo dos últimos quatro anos como perito em resgates.

– Embora pareça que nos livrámos definitivamente de Lancaster, não podemos arriscar-nos a deixar coisas por fazer. Precisas de desaparecer durante um tempo. Como se a terra te tivesse engolido. Conheces algum sítio assim?

Brand Sheridan conhecia um lugar que reunia perfeitamente essas condições. Um lugar onde ninguém o relacionaria com Brian Lancaster. Um lugar com muitas árvores, com ruas à sombra e onde ninguém trancava a porta da sua casa. Um lugar onde a única coisa interessante que podia fazer-se numa sexta-feira à noite era jogar na Liga de Harrison Park.

Era o lugar onde crescera, mas também onde se recusara a enterrar a sua juventude. Sentia pavor de regressar. Mas tinha de o fazer.

– Senhor, ainda tenho algumas licenças por gozar.

Era uma forma de falar. Brand Sheridan estivera na clandestinidade durante quatro anos. Levara o seu novo papel tão a sério que não se permitira um só instante de ócio em todo aquele tempo. Levara a sua missão a cabo com tanto profissionalismo, como se a sua vida dependesse disso.

O seu chefe olhou para ele com um certo receio.

– Preciso regressar a casa – disse Brand.

A palavra «casa» pareceu-lhe tão estranha como quando ouvira o seu nome da boca do seu chefe.

– Será um sítio seguro?

– Acredite, se um tipo como Brian Lancaster tivesse de se esconder, Sugar Maple Grove seria o último lugar onde o encontrariam.

– Uma vila com quatro gatos?

– Não penso que haja tantos – brincou Brand. – Fica no estado de Vermont, na encosta das Green Mountains. Penso que as pessoas continuam a ir buscar água à fonte e as crianças vão para a escola de bicicleta. O maior acontecimento do ano é o concurso de rosas e jardins – hesitou durante alguns instantes antes de continuar: – A minha irmã está muito preocupada. Receia que o meu pai não consiga aguentar a morte da minha mãe. Preciso de ir ver como está.

Mas sabia que o pai não o receberia com agrado.

– A tua mãe morreu enquanto estavas fora, não foi?

– Sim, senhor.

Sim, nesse ano, ela sentira-se muito orgulhosa por ter participado no concurso de jardins e ter recebido o prémio das rosas mais belas da cidade.

– Lamento que não tenhas podido ir ao seu funeral.

– Não se preocupe, senhor. Faz parte do meu trabalho.

Mas isso era uma coisa que só alguém que tivesse o mesmo trabalho que ele é que podia compreender. E esse não era o caso do pai, um simples médico de vila.

– A operação Chop-Looey foi um sucesso. Excelente trabalho! – exclamou o chefe. – Foste proposto para uma condecoração.

Brand não disse nada. Vivera num mundo de sombras, onde as pessoas eram recompensadas pelas suas habilidades, por se fazerem passar pelo que não eram, pela sua habilidade para traírem as pessoas que confiam nelas. Por esse tipo de coisas recebia-se uma condecoração? Era difícil separar o que era o seu trabalho do que ele era como pessoa. De qualquer modo, não se sentia precisamente orgulhoso disso.

Não queria voltar a Sugar Maple Grove. O pai estava zangado com ele e com razão. A irmã pedira-lhe um trabalho ingrato.

– Penso que a minha estadia em Sugar Maple Grove não demorará mais de uma ou duas semanas – disse Brand.

– Seria melhor ficares um mês. Assim, teríamos tempo para traçar um plano eficaz para a tua protecção pessoal.

Um mês em Sugar Maple Grove! O que ia fazer ali tanto tempo?

– Sim, senhor – respondeu, pensando que, pelo menos, ali conseguiria dormir tranquilo à noite.

1

O céu escuro do Verão estava cheio de estrelas. Eram como um enxame de pirilampos brilhantes a dançar, resplandecentes, na abóbada celeste, antes de desaparecerem para sempre. Era a noite perfeita para uma despedida.

– Adeus – disse Sophie Holtzheim, em voz alta. – Adeus, meus estúpidos sonhos românticos.

A sua voz parecia apagada e triste na quietude da noite. Era a voz de uma mulher que estava a despedir-se de todos os planos de futuro, que com tanto esmero planeara.

Sophie estava no jardim do vizinho. Aproveitara a sua ausência para usar o seu buraco de queimar lixo, embora a verdade era que se sentia irresistivelmente atraída pela intimidade e beleza do lugar.

A casa de Sophie pertencia a um conjunto de construções de estilo colonial dos anos trinta, localizada num extremo de Sugar Maple Grove. Apesar da grande cerca que protegia a propriedade, não queria correr o risco de alguém sair para ir passear o cão ao fim da noite e ver o resplendor da fogueira... Nem uma mulher vestida de branco a falar sozinha.

Porque era o que ela era, uma mulher sozinha, num sábado à meia-noite, usando o seu vestido de casamento, que desejava um instante de intimidade, a salvo dos rumores das pessoas.

Sophie Holtzheim alimentara aquela ideia durante os últimos seis meses.

Respirou fundo e alisou o seu fato de seda branco com a mão. Era um vestido de que gostara assim que o vira, com as suas alças finas e o decote discreto.

– Nunca me casarei com este vestido.

As palavras de Sophie ouviram-se com firmeza e resignação. Esperava que dizê-lo em voz alta lhe servisse de alguma ajuda, mas não foi assim.

Suspirando, abriu a caixa que tinha junto dela e examinou o conteúdo.

– Adeus – disse, num sussurro.

Lá dentro havia uma colecção de convites de casamento com nomes inscritos, diversos padrões de vestidos de noiva, recortes de revistas com centros de mesa e enfeites de flores, e folhetos de agências de viagens com imensos destinos para passar uma lua-de-mel de sonho.

Sophie pegou no convite que estava mais à vista.

«Não leias», disse para si. «Atira-o para a fogueira directamente.»

Mas não o fez. À luz da chama crepitante da fogueira que acendera no jardim do doutor Sheridan, deslizou os dedos sobre as letras da cartolina que tinha na mão. Era o convite que escolhera para o seu casamento.

– «Duas pessoas – disse, lendo em voz alta, – unem o seu amor neste dia, para se transformarem numa só. Harrison Hamilton tem o prazer de o convidar para a celebração do casamento do seu filho, Gregg, com a menina Sophie Holtzheim.»

Com um soluço, atirou o convite para a fogueira, observando como os seus cantos dourados se tornavam cada vez mais escuros e depois todo ele se rendia e se retorcia nas chamas.

Gregg não ia unir a sua vida à dela, mas à de Antoinette Roberts.

Durante os últimos meses, tentara manter a esperança viva de que tudo voltaria ao normal, de que Gregg recuperaria a sensatez.

Contudo, naquela mesma tarde, perdera-a definitivamente ao receber um convite em que figurava o nome de Antoinette Roberts em vez do dela.

Não era um convite de casamento. Era para uma festa que os pais de Gregg dariam na casa de luxo que tinham nos subúrbios de Sugar Maple Grove.

– Gregg e eu estivemos noivos, mas nunca tivemos uma festa de noivado.

Sophie sentia-se menosprezada ao ver que todos os olhares e cuidados recaíam sobre a nova noiva.

Era a gota de água. Deixou brotar todas as lágrimas que reprimira ao longo da tarde e congratulou-se por não se ter maquilhado para a cerimónia de despedida dos seus sonhos e esperanças.

Como é que Claudia Hamilton, a mãe de Gregg, podia ter feito aquilo? Era demasiado cruel convidá-la para aquela festa, onde Gregg apresentaria a mulher que a substituíra. Mas Claudia, que vira muitas revistas de noivas com ela, deixara os seus motivos bem claros.

– Não quero que pareça que te desprezamos, querida. Toda a cidade vai estar lá e tu também deves estar. Pelo teu próprio bem. Já passaram vários meses desde que acabaram. Não tentes parecer patética. Tenta ir acompanhada e dar a impressão de que refizeste a tua vida. Não podemos continuar toda a vida a ouvir as pessoas a dizer que Gregg te partiu o coração. Não seria bom, nem para ele nem para Toni. Não é agradável que ele seja visto como o vilão da história, não te parece?

Ela era, contudo, a única e verdadeira responsável por toda aquela catástrofe.

– Se pudesse voltar atrás... – disse, deixando que as lágrimas caíssem pelas suas faces. Se pelo menos fosse possível desdizer algumas das palavras que pronunciara.

Reviveu-as naquele instante, avivando a fogueira que tinha à frente dela, até ver a imagem de um bolo nupcial de três andares, com um ramo de rosas amarelas a enfeitar.

– Gregg – dissera-lhe no dia em que ele regressara a South Royalton, para acabar o curso de Direito e a pressionara para que marcassem uma data para o casamento. – Preciso de um pouco de tempo para pensar nisso.

Agora, teria toda a vida para o fazer. Toda uma vida para pensar na razão por que deitara tudo a perder por causa de um momento de indecisão.

Pensava que conhecia bem Gregg, nunca imaginara que reagiria daquela maneira. Sempre pensara que era uma pessoa muito compreensiva. Mas ficara muito furioso. Como é que ela se atrevera a dizer que precisava de pensar?

Os Hamilton eram a aristocracia de Sugar Maple Gro ve.

Sophie Holtzheim era simplesmente a menina simpática, que toda a cidade começara a adorar por, há dez anos, ter dado Sugar Maple Grove a conhecer em todo o Estado, ao vencer o Concurso Nacional de Redacção, com Os Encantos de uma Pequena Cidade.

Não era de estranhar que ficasse boquiaberta quando Gregg Hamilton reparara nela. O facto de se preocupar tanto com a opinião dos outros e se comportar de um modo pouco romântico, eram coisas que não podiam considerar-se defeitos.

Especialmente agora, quando olhava para trás.

Mas não tinham sido essas coisas que a tinham incomodado. Fora uma coisa muito diferente, uma coisa que se escondia debaixo da superfície e que ela não conseguia ver, nem se atrevia a nomear. Uma coisa que ao princípio a inquietara, depois a zangara, depois a incomodara e, finalmente, conseguira destruir todo o seu mundo.

Porque quando ela não conseguira ignorá-la por mais tempo, quando começara a sentir uma dor aguda no estômago, vinte e quatro horas por dia e, não conseguia dormir, falou com Gregg, num tom hesitante, como se se desculpasse: «Não posso pôr a mão no fogo. Mas penso que alguma coisa não está bem.» E tirara o anel com aquele diamante enorme e devolvera-lho.

Mas não estava preparada para a reacção surpreendente e rápida de Gregg. Substituíra-a. Poucas semanas depois do incidente do anel, tinham chegado aos seus ouvidos rumores de que Gregg estava a sair com outra rapariga na universidade.

Ao princípio, pensara que se tratava de uma estratégia para a deixar com ciúmes. A relação que tinham mantido fora suficientemente profunda e Gregg não a substituiria por outra mulher em tão pouco tempo.

Mas agora tinha a confirmação na mão. Não, não se tratava de lhe fazer ciúmes. Fora substituída. Não era nenhuma brincadeira, nem uma questão de despeito. Gregg não ia voltar para ela. Nunca. Era o fim. Tudo acabara entre eles. Para sempre.

Claudia dissera-lhe que não devia ser patética. Não era demasiado tarde para isso? Não era assim que todos a viam?

Se Claudia Hamilton pudesse vê-la agora, naquela cerimónia de sacerdotisa druida, encostada à sua caixa de sonhos e vestida com aquele fato que nunca mais usaria, o quadro que veria só serviria para confirmar as suas palavras.

Patética. A queimar a sua caixa de sonhos, a reviver aquelas palavras e a perguntar, mais uma vez, o que teria acontecido se nunca tivessem chegado a sair da sua boca.

– Não tenciono ir a essa festa – disse, num tom de voz firme e seguro pela primeira vez. – Nunca. Nem que me levem de rastos. Não me importo com o que os Hamilton pensam.

Saboreou aqueles breves segundos de exaltação e firmeza. E depois ficou devastada.

– O que fiz? – perguntou, entre soluços.

De repente, sentiu um arrepio. Sentiu-o antes de o ver. Seria um cheiro no ar? Uma mudança quase eléctrica na textura aveludada daquela noite de Verão?

Alguém se aproximara do jardim. Chegara em silêncio e estava a observá-la. Há quanto tempo estaria ali? Quem seria?

Virou a cabeça muito devagar. À primeira vista, não viu nada. Depois, distinguiu a silhueta de um homem. Uma silhueta mais negra do que as sombras da noite.

Estava de pé, em silêncio, junto do portão de entrada e tão quieto que parecia que não respirava. Tinha uma presença física imponente de um metro e oitenta e estava numa atitude tranquila, ao mesmo tempo que a espiava, como um predador felino.

O seu coração começou a acelerar, mas não por medo.

Apesar de a escuridão esfumar os seus traços, apesar de já não estar naquele jardim há oito anos, apesar de o seu corpo ter um aspecto mais maduro e musculado, não teve dificuldade em reconhecê-lo.

Era o homem que arruinara a sua vida.

Mas não era o mesmo homem cujo nome figurava junto do seu, naquele convite que acabara de condenar à fogueira.

Era o homem que tivera na mente, quando dissera a Gregg que precisava de um pouco de tempo para pensar.

Não o nomeara, nem sequer no seu pensamento. Mas sentira um desejo de alguma coisa que, só ele, Brand Sheridan, o filho do médico, o soldado errante, conseguira despertar nela.

Fora ridículo deitar toda a sua vida fora por uma coisa que acontecera quando era apenas uma adolescente. Mas não havia nada que pudesse substituir esse sentimento. Era como a sensação que se sente no estômago, quando se salta do alto das falésias de Blue Rock, nesses breves segundos entre tomar a decisão de se lançar no vazio e sentir o golpe sobre a superfície gelada da água. Uma coisa vital, intensa. Como se aquele momento glorioso fosse a única coisa importante.

Brand fizera-a sentir sempre isso. Ela tinha só doze anos quando a sua família se mudara para a casa contígua à do doutor Sheridan. Brand tinha dezassete.

Bastara-lhe olhar uma vez para os seus olhos, para sentir uma inquietação profunda. Uma inquietação que despertava sonhos impossíveis de felicidade.

Amara desesperadamente o homem que estava agora ali de pé, na escuridão, como só uma adolescente era capaz de o fazer. De uma forma irreal, apaixonada e não correspondida.

O facto de ele mal ter reparado nela, longe de a desanimar, conseguira avivar os seus sentimentos.

Sentiu um arrepio familiar na barriga ao ouvir a sua voz.

– O que se passa aqui?

Sabia que os seus olhos eram de um azul mais intenso do que a safira. Mas, na sombra, pareciam tão pretos e sedutores como naquela noite de Verão, e carregados de novos mistérios insondáveis.

Por um instante, sentiu-se completamente paralisada, mas recuperou depressa. Não ia permitir que, depois de oito anos de ausência, a visse assim.

Encaminhou-se para a saída que a pequena abertura que havia na sebe lhe oferecia. Mas lembrou-se da maldita caixa, com as suas estúpidas lembranças românticas.

Não podia ir-se embora, deixando-a ali para que ele a encontrasse. Virou-se, pegou na caixa e então... A catástrofe. Pisou a bainha do vestido, tropeçou e caiu no chão. Deixara aquele vestido demasiado comprido, com a esperança de parecer mais alta e esbelta quando tivesse de desfilar pelo corredor da igreja, no dia do seu casamento.

A caixa escapou-lhe das mãos e todas as coisas que havia dentro, papéis e fotografias, voaram pelo ar.

Ele aproximou-se, solícito. Pôs a mão sobre o seu ombro nu e ajudou-a a dar a volta. Ela sentiu o seu olhar e o calor da sua mão, e viu-se inundada numa sensação de embriaguez, como se tivesse bebido uma garrafa inteira de champanhe.

Ele observou-a de cima, com o sobrolho franzido e uma expressão que infundia medo. Aquele homem seria realmente Brand?

Então, as feições duras do seu rosto suavizaram-se levemente, enquanto um ar de interrogação se desenhou nas suas sobrancelhas.

– Sweet Pea?

O seu rosto cativou-a. Um rosto que ainda conseguiria parar o sol, mas no qual via agora uma nova dimensão: uns traços de aço e um olhar mais frio. Havia alguma coisa na sua expressão que nunca vira antes.

Ele retirou a mão do seu ombro e passou-a suavemente pela face para lhe tirar uma erva. Era difícil imaginar que aquelas mãos tão fortes podiam ser tão suaves.

Tentando evitar novas catástrofes, endireitou-se, sacudindo o pó do vestido. O amor que sentia por ele deixava-a trôpega.

Fechou os olhos numa tentativa de esquecer a humilhação do momento.

Durante a sua adolescência, depois de ele se alistar no exército, imaginara mais de um milhão de vezes como seria o seu regresso. O dia em que voltaria a casa e a veria, não como uma menina desajeitada, mas como uma mulher. Imaginara a sua voz rouca a dizer-lhe, surpreendido, ao vê-la: «Sophie, estás tão bonita.»

Mas o que lhe disse foi muito diferente:

– És tu? Sweet Pea?

Ela permitiu-se lançar-lhe um novo olhar para se embriagar com o seu perfume, a sua presença e o seu mistério.

Brand Sheridan tinha sido sempre um homem muito atraente. E não porque era especialmente bonito, havia muitos homens terrivelmente bonitos. Nem porque tinha uma constituição atlética e musculada, havia também muitos homens com um corpo invejável.

Não, era outra coisa, escondida, impossível de definir, primitiva como o som de um tambor, que tinha a virtude de a deixar embevecida.

Desde o dia em que a sua família se mudara para a casa ao lado da dos Sheridan, dedicara-se a adorar e a idolatrar aquele seu vizinho, cinco anos mais velho do que ela.

Divertido e atrevido, Brand Sheridan fora sempre demasiado excessivo em tudo para a vila aprazível e tranquila de Sugar Maple Grove. Demasiado aventureiro, demasiado impaciente, demasiado activo e vital.

O seu pai, o médico da vila, era um homem convencional. Coisa que Brand detestava. Para desilusão do doutor Sheridan, Brand não quisera seguir a tradição familiar, deixara a universidade e alistara-se no exército, deixando a sua cidade natal sem olhar para trás.

Sophie alegrara-se tanto como os próprios pais de Brand, quando ele regressara aos Estados Unidos, depois de um longo período de actividades no estrangeiro.

Quando fora aquilo? Há cinco anos? Não, tinha de ter sido um pouco mais, porque ele estava fora do país quando os pais dela morreram. A verdade era que Brand nunca voltara realmente.

Para desolação da mãe, quando estava prestes a celebrar o fim da sua missão arriscada e do seu regresso a casa, alistara-se num grupo internacional de soldados de elite. Passava a maior parte do tempo a treinar na costa oeste, em países estrangeiros ou em missões arriscadas.

Sophie sabia que ele se encontrara com os pais na Califórnia, em Londres e em Paris e, ocasionalmente, aparecera numa reunião familiar, na casa da sua irmã Marcie, em Nova Iorque.

À medida que o tempo passava, tornou-se cada vez mais evidente que Brand Sheridan deixara Sugar Maple Grove e que nunca regressaria. Não se sentira atraído pelos supostos atributos da cidade, que ela gabara naquele trabalho intitulado Os Encantos de uma Pequena Cidade.

Todos na cidade se tinham sentido emocionados, quando Brand nem sequer assistira ao funeral da sua própria mãe. Naquele dia, perdera também o respeito e a admiração do seu pai.

– Brandon – disse Sophie, um pouco nervosa, depois do seu longo exame visual, usando o seu nome completo em vez do diminutivo, para que visse que estava disposta a lidar com ele de forma adulta e que podia pôr de parte as suas expressões carinhosas como «Sweet Pea». – Não te esperava.

Assim que disse aquilo, arrependeu-se. Sempre ti-vera o dom de dizer inconveniências no momento mais inoportuno.

Claro que não o esperara! Estava na rua à meia-noite, com um vestido de noiva!

– Esperavas outra pessoa então? – perguntou ele.

Estendeu-lhe a mão e Sophie agarrou-a, tentando disfarçar o efeito que o contacto daquela mão firme e segura causava no seu coração.

Brand puxou-a para a ajudar a endireitar-se. Coisa que fez com grande facilidade.

– Não, não esperava ninguém – respondeu. – Só estava a queimar o lixo.

– A queimar o lixo... – repetiu ele, com um leve sorriso nos lábios.