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HarperCollins 200 anos. Desde 1817.

 

Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 1997 Elizabeth Bevarly

© 2017 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Encontro com o passado, n.º 239 - setembro 2017

Título original: Georgia Meets Her Groom

Publicado originalmente por Silhouette® Books.

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial.

Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Harlequin Desejo e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença.

As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-9170-319-8

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño, S.L.

Sumário

 

Página de título

Créditos

Sumário

Prólogo

Capítulo Um

Capítulo Dois

Capítulo Três

Capítulo Quatro

Capítulo Cinco

Capítulo Seis

Capítulo Sete

Capítulo Oito

Capítulo Nove

Capítulo Dez

Capítulo Onze

Epílogo

Se gostou deste livro…

Prólogo

 

Só a conhecia de vista. Sabia que se chamava Geórgia Lavender e que o seu pai era praticamente o dono de toda a vila Carlisle, no estado de Virgínia, que embora no Verão se tornasse num próspero centro de férias, durante o resto do ano era uma pequena mancha no mapa. Toda a gente sabia que Geórgia era rica e muito inteligente, era a rapariga que tinha avançado dois anos na escola primária e que, aos catorze anos, era a aluna mais jovem da escola.

Assim, como toda a gente sabia que ele era o aluno mais velho da escola, com quase dezassete anos. Tinha chumbado dois anos: uma vez no sexto ano e outra no sétimo. E também sabiam que não era por ser estúpido, mas porque causava demasiados problemas.

Com uma agravante, nem sequer era de Carlisle. Aquela era simplesmente a última vila à qual tinha chegado, depois de muitas outras e depois de ter sido expulso de mais um lar de adopção, devido ao que os assistentes sociais denominavam de: «um comportamento anti-social». E, apesar de ser novo na vila, não demorara muito a afirmar a sua reputação.

Enquanto atravessava o estacionamento da escola, Jack McCormick olhou com interesse a forma como Geórgia Lavender ia ter com o seu pai, que a esperava apoiado, com gesto indolente, no seu luxuoso carro, último modelo. A roupa que a jovem vestia, saia castanha, blusa e meias brancas, sugeria uma origem humilde, o que estava muito longe de ser verdade. Jack sabia que Susie Morris e as outras raparigas se costumavam rir de Geórgia por causa disso, mas até agora não prestara atenção àquele pormenor.

Usava também uns óculos de aros grossos, que lhe davam a aparência de um pequeno e tímido animal de olhos enormes, desproporcionados em relação ao resto do corpo. O seu cabelo era medíocre, no mais amplo dos sentidos: não era completamente ruivo, nem muito comprido, nem muito encaracolado… No entanto, a Jack não lhe passaram desapercebidos os maravilhosos reflexos dourados que reflectia ao sol.

«Não é nenhuma beleza», pensou Jack. Mas naquele tempo, ele também não era nada impressionante. Inconscientemente, passou uma mão pela face esquerda, onde sabia que tinha uma vistosa nódoa negra. O seu pai adoptivo dera-lhe uma boa bofetada, quando lera a sua caderneta de notas. Aquilo não era nenhuma novidade, mas Jack teria dado qualquer coisa para poder sair de casa, nem que fosse só uma vez, para não apanhar as bofetadas do velho.

Afastando a comprida franja preta que lhe caía sobre os olhos, olhou outra vez para Geórgia e para o seu pai; a jovem diminuíra o passo e olhava para ele com um ar desconfiado. Inexplicavelmente, Jack também reduziu o passo e demorou a abrir a porta do seu velho carro, para pousar os livros no banco de trás. De costas para a cena que se desenrolava atrás dele, esticou os ombros e coçou o pescoço. Por alguma estranha razão, sentia-se tenso e irritado.

– Geórgia – pronunciou o homem, com uma voz que gelou o sangue das veias de Jack.

Com uma só palavra convertera o cumprimento num insulto e numa ameaça. Jack sabia que aquilo não fazia sentido, mas ficou imediatamente na defensiva, fechando os punhos.

– Geórgia – repetiu o homem, com o mesmo tom. – Porque é que não me mostraste ontem as tuas notas?

A rapariga parou ao pé do seu pai. Jack nunca teria feito aquilo, tentava sempre manter uma distância prudente.

– Porquê, Geórgia? – insistiu, aproximando-se.

Sem levantar o olhar, com uma voz tão baixa que Jack quase não conseguiu ouvir, a jovem respondeu:

– Não estavas em casa.

– Sabias que voltaria tarde do trabalho. Porque é que não as deixaste sobre a mesa, como te disse para fazeres?

Geórgia levantou bruscamente o olhar e voltou a baixar a cabeça, num claro gesto de submissão.

– Des… desculpa, papá. Esqueci-me.

– Esqueceste-te?

A jovem anuiu em silêncio.

– Bom, mas eu não me esqueci. E, para a tua informação, entre o colchão e a cama há um bom esconderijo. Foi no primeiro sítio que procurei – a sua voz reflectia desdém, e a rapariga deu um salto para trás, como se lhe tivessem dado uma bofetada. – Tiveste um Bom, Geórgia. Um Bom! E em química, pelo amor de Deus! Como é que vais entrar para uma universidade como a MIT com uma nota dessas?

Jack não queria acreditar no que estava a ouvir. Aquele homem estava zangado, porque a sua filha tivera uma nota que ele teria ficado contentíssimo de ter! E numa disciplina à qual não lhe era permitido frequentar, por causa do seu suposto comportamento.

– Desculpa, papá, eu…

– Desculpa! Asseguro-te que vais pedir desculpa, se volto a ver uma nota dessas na tua caderneta, juro-te que… Será melhor que tenhas cuidado, Geórgia, pois… o que é que pensas que vai acontecer se não conseguires entrar para a universidade? Com certeza, não te casas. Olha para ti… qual é o homem que vai querer casar contigo? E eu não quero ter que te suportar como uma carga para o resto da minha vida, percebes?

Enquanto o seu pai a atacava daquela maneira, Geórgia permanecia imóvel, com a cabeça baixa, ouvindo. Jack, pelo contrário, enfurecia-se. Sem se aperceber, foi-se aproximando até ficar atrás da rapariga. Depois, sem dizer nada, agarrou-a pelos ombros para a afastar com delicadeza e ficar diante do pai dela.

O pai de Geórgia viu-se obrigado a levantar a cabeça para o encarar.

– Quem demónios és tu?

Jack esboçou um sorriso trocista, a expressão que adoptava sempre que ia lutar com alguém.

– Jack McCormick. E tu? Quem és?

– Gregory Lavender, o pai de Geórgia – replicou, claramente surpreendido pelo seu descaramento. – E agora, vai-te embora daqui.

– Não. Geórgia e eu temos um encontro.

Olhando para ele com os olhos quase fechados, Gregory respondeu ameaçadoramente:

– Ouve, rapaz, eu…

– Não, ouve-me tu a mim – interrompeu Jack, furioso. – Se te queres zangar com alguém, fá-lo comigo, se te atreves, mas deixa Geórgia em paz. Ela não fez nada de mal.

– Isto não é assunto teu, miúdo – advertiu o homem, cravando-lhe um dedo no peito.

Jack afastou-lhe o dedo sem esforço. E embora continuasse a olhar fixamente para Gregory Lavender, acrescentou dirigindo-se à sua filha:

– Vem, Geórgia, vamos embora.

Agarrou-a pela mão e empurrou-a suavemente para o seu carro. Mas Geórgia não o seguiu. Quando Jack se virou para ela, viu que olhava para ele com os olhos enormes, muda de terror.

– Geórgia? – chamou-a, num tom suave. – Vens?

Com os livros fortemente apertados contra o peito, depois de lançar um rápido olhar para o pai, deu um passo hesitante para Jack. Depois outro… e mais outro.

– Geórgia… – advertiu o pai.

– Não me vou atrasar, papá – replicou, com a voz a tremer. – Estarei em casa antes da hora de jantar, prometo.

– Geórgia, não acabámos…

– Ouve, velho, ela acabou de dizer que vai estar em casa à hora de jantar – interrompeu Jack. – Qual é o problema?

Surpreendeu-se de que o homem não reagisse ao seu tom de troça e de que não reprimisse desde o início aquele acto de rebeldia. E esperava que a rapariga não tivesse problemas quando voltasse para casa. Mas pelo momento, fizera-a ganhar aquela batalha e com isso a sua auto-confiança fora reforçada.

«De agora em diante», pensou, «Gregory Lavender saberá que a sua filha conta com um defensor que a protegerá de qualquer ameaça. Talvez este momento possa ser uma viragem na sua vida. E porque não? Talvez também na minha».

Depois de lhe abrir a porta do carro e de a ajudar a entrar, sentou-se ao volante. Ligou o motor com energia e virou-se para ela, sorridente.

– Olá.

– Olá – Geórgia devolveu-lhe o cumprimento.

– Chamo-me Jack McCormick.

– Já sei – replicou Geórgia, com um leve sorriso. – Sempre… – interrompeu-se, encolhendo os ombros e segurando os óculos com um dedo. Depois, com um gesto inocente, estendeu uma mão para lhe acariciar a face. – Bom, realmente, estou muito contente por te conhecer.

Capítulo Um

 

Jack McCormick encontrava-se sentado atrás da sua enorme e luxuosa mesa de escritório, com uma expressão abstracta. Diante dele tinha um envelope marcado com o selo «confidencial» e uma carta com o seguinte cabeçalho: Roxanne Matheny Investigations, Inc. Lera a carta pelo menos quatro vezes, mas não conseguia acreditar no seu conteúdo.

Sem pensar no que estava a fazer, abriu a primeira gaveta da sua mesa de escritório para tirar uma velha bola de basebol. Fechou os dedos sobre ela e acariciou a sua suave textura com afecto, quase com amor. Era o único objecto que ele levava para todos os lados. Tudo o mais se perdera num ponto ou noutro da sua vida. Até agora.

Olhou outra vez para a carta. Finalmente, tinham-no encontrado. Inclusive antes dele ter tido oportunidade de os procurar.

Saiu das suas reflexões, ao ouvir baterem à porta e levantou a cabeça.

– Entre.

Adrian Chavez, o seu ajudante, entrou na sala, mas hesitou um instante ao ver a expressão sombria do seu patrão.

– Aconteceu alguma coisa?

Jack negou lentamente com a cabeça e apertou entre os dedos a bola de basebol.

– Que notícias há? – inquiriu, sem responder à pergunta.

– A aquisição de Lavender.

Com o queixo tenso, Jack deixou a bola de lado e estendeu a mão para agarrar no documento que o seu assistente lhe oferecia.

– E o que é que Gregory Lavender tinha para nos dizer hoje?

Adrian olhou pensativo para o seu patrão e cruzou as mãos atrás das costas.

– Não mais do que já disse durante estes últimos meses – claramente inquieto, cruzou os braços sobre o peito com uma atitude negligente, como se não desse muita importância ao assunto.

– O que é? – perguntou Jack, sorrindo satisfeito – Tinha mais alguma coisa a dizer desta vez?

– Sim – replicou Adrian. – De facto, tinha algo a dizer sobre ti.

– Posso imaginar o que foi.

Adrian observou o patrão com uma certa admiração.

– Gregory Lavender disse que preferia ver-te morto do que deixar-te a sua empresa. Sobretudo depois do que fizeste à sua filha.

– Teria apostado nisso.

– Mas… pode-se saber o que lhe fizeste à filha?

– Libertei-a – respondeu Jack, olhando-o com os olhos quase fechados.

– Parece divertido…

– Realmente, é muito mais do que isso…

Respirou fundo, deixando a frase por concluir. Tinham passado mais de vinte anos desde que vira pela última vez a filha de Lavender. Mas não passara nem um só dia que não pensasse nela. Tê-la-ia libertado? Não, realmente fora Geórgia quem se libertara dele.

Adrian continuava a olhar para o seu patrão e renunciou a fazer-lhe mais perguntas sobre Geórgia Lavender.

– Então, o que é que vamos fazer agora?

Jack riu baixinho. Esperara muitos anos por aquele momento.

Há uma expressão que diz que a vingança é um prato que se deve servir frio… E essa era a descrição mais adequada para o que Jack sentia no mais íntimo do seu ser. Frieza, raiva, amargura… Aquilo compensá-lo-ia muito pelo que sofrera no passado… e a Geórgia Lavender também. Acabaria com uma dívida que tinha para com ela que durara demasiado tempo.

Olhou outra vez para a carta de Roxanne Matheny. Também esperara muito tempo para receber aquilo. Estava tudo a encaixar no seu devido lugar, mas demasiado cedo, não tinha a certeza de poder solucionar as duas coisas ao mesmo tempo. No entanto, um homem tinha que aproveitar ao máximo as suas oportunidades e na altura em que estas se lhe apresentavam. Essa era a única forma de sobreviver que Jack conhecia. E tinha sido isso que lhe salvara a vida.

Bom, isso e Geórgia Lavender.

Chegara a hora de regressar a Carlisle. A hora de saldar a sua dívida para com Geórgia. A hora de fazer com que Gregory Lavender pagasse pelo que fizera à sua única filha.

A hora de Jack reclamar o que lhe correspondia por direito.

 

 

As ondas altas e cinzentas enrolavam e rebentavam em espuma na praia, que ficava por baixo da casa de Geórgia Lavender. De pé no terraço, com o seu comprido cabelo ruivo ao vento, Geórgia não conseguia distinguir a fina linha do horizonte na qual o mar e o céu se confundiam. Tinham passado alguns dias desde que vira pela última vez o sol. Mas não lhe importava.

Se não tivesse pintado aquela mesma paisagem pelo menos uma dúzia de vezes, nos últimos meses, teria corrido para dentro de casa para ir buscar a sua paleta e os seus tubos de tinta. A costa de Carlisle, no Inverno, ficava inundada por uma enorme variedade de tons cinzentos que algumas vezes conseguira captar na suas telas. A sua galeria estava cheia daquelas telas, mas os turistas nunca se cansavam de as comprar.

Fazia frio e apetecia-lhe dar um passeio. Evan ainda demoraria a chegar a casa e por qualquer razão estranha, sentia-se inquieta. Entrou em casa e encontrou a sua cadela, Molly, aparentemente a dormir. Mas bastou que ela assobiasse para que acordasse de imediato.

– Queres ir passear? – perguntou-lhe Geórgia.

A cadela, grande e de pelagem dourada, ladrou, desejosa de fazer exercício.

Geórgia vestiu um casaco amarelo de lã e apanhou o seu cabelo numa trança grossa. Depois de vestir o casaco, decidiu não procurar a trela de Molly, dado que a praia estava deserta. Estava há um ano a morar naquela casa e sabia que naquela altura do ano, ela e Evan eram os únicos habitantes em vários quilómetros.

No entanto, a solidão não era um problema para eles, os dois gostavam de estar longe das constantes restrições da sociedade.

Quando desceu as escadas para chegar à praia acompanhada por Molly, Geórgia teve a sensação de ser o único ser humano no mundo. Andou um bocado pela costa, parando de vez em quando para apanhar pedrinhas que depois lançava à água.

Quando chegou ao Clube Náutico de Carlisle, tinha o rosto e as mãos geladas do frio e decidiu entrar no restaurante para beber uma chávena de chocolate quente. O cartaz, que estava por cima da porta e dizia: Bar de Rudy. O melhor peixe, contrastava vivamente pelas suas cores com o cinzento da paisagem. «O próprio Rudy é um tipo vivaz e animado», pensou Geórgia, com um sorriso, enquanto chamava Molly e se dirigia para o bar.

– Rudy! Sou Geórgia! – chamou, ao entrar no local, que aparentemente estava deserto. Sentando-se num banco, com Molly deitada aos seus pés, tentou outra vez, já que ninguém respondia: – Rudy?

– Estou aqui! – gritou, por fim, uma voz desde a cozinha. – Daqui a uns quinze minutos vou para aí, assim que acabar de preparar isto. Serve-te a chávena de chocolate… já sei que é isso que queres.

«Rudy conhece-me demasiado bem», pensou Geórgia, enquanto se levantava. Depois de preparar uma chávena grande de chocolate, começou a passear inquieta pelo bar. De repente, ao olhar pela janela, viu que um carro desportivo cinzento, com matrícula de Washington, parava no estacionamento. Perguntou-se imediatamente quem poderia querer visitar Carlisle com um tempo daqueles, tão frio e cinzento e sem ser fim-de-semana.

Do carro saiu um homem alto, de costas largas e cabelo muito preto. Parecia estar há muitas horas a guiar, pois, mal saiu dedicou-se a esticar os braços e as pernas.

Continuava de costas para ela e ainda não vestira o casaco, apesar da temperatura baixa. Geórgia quase que podia ver os contornos dos seus músculos, delineando-se através do tecido da sua camisola azul escuro. Quando se inclinou para a frente, ela não conseguiu deixar de reparar no bem que lhe ficavam as calças de ganga. Depois, o homem tirou um casaco de couro do carro, vestiu-o e entrou no restaurante.

Foi então que Geórgia parou de respirar e, quase involuntariamente, colou o seu rosto ao vidro da janela. E não era que aquele homem fosse o mais atraente que alguma vez vira, ou porque não deixara de olhar para ela enquanto caminhava, despertando nela uma excitação e umas sensações estranhas que nunca antes sentira.

Era porque, de alguma forma, lhe era muito familiar.

Não tinha a certeza, mas pensou ver uma certa hesitação no seu passo, quando a viu observá-lo pela janela, mas recuperou imediatamente. Geórgia sentia-se incapaz de parar de olhar para ele, enquanto se aproximava da porta do restaurante. O vento fustigava-lhe com o cabelo e não lhe conseguia ver claramente os olhos.

Perdeu-o de vista quando ele entrou e se afastou da janela. Com a escassa luz do local, não conseguia distinguir as suas feições, mas olhava para ele com o coração a bater-lhe aceleradamente no peito. Definitivamente, era-lhe muito familiar.

O homem deu uns passos para ela, saindo por entre as sombras, mas o seu rosto continuava às escuras. Quando falou, as suas palavras pareceram tingidas de melancolia.

– Não te lembras de mim? – inquiriu, num tom suave.

Ao princípio, Geórgia, limitou-se a negar com a cabeça. Depois ele deu outro passo à frente, de forma a conseguir finalmente ver-lhe o rosto. Viu os seus olhos, de uma cor azul escura inconfundível, uns olhos expressivos, que há muito tempo a tinham conseguido fazer rir e comover.

Geórgia mordeu o lábio. Agora os olhos de Jack reflectiam tristeza e cansaço.

– Jack McCormick – murmurou ela.

Mal ela pronunciou o seu nome, a nuvem de tristeza evaporou-se e ele esboçou um leve sorriso, comovedoramente familiar. Geórgia sentiu um nó no estômago, ao reparar como tivera saudades dele durante todos aqueles anos.

– Então, lembras-te – replicou, suavemente, aproximando-se dela com um passo lento e hesitante. O seu tom de voz ficara mais rouco com o passar dos anos, mas ainda era terno e jovial. E como sempre acontecera, o seu sorriso fê-la sorrir.

Jack riu e, por um instante, Geórgia voltou a ver o jovem que conhecera há mais de vinte anos atrás. Algo na sua atitude a fez descontrair-se, as sombras abandonaram os seus olhos e olhou para ela com a mesma expressão de surpresa que reservara só para ela. Olharam-se em silêncio por um bom bocado.

Geórgia estudou o seu rosto, comparando-o com o que conhecera há tanto tempo atrás. Eram basicamente iguais, mas havia muitas diferenças. Já não tinha aquele cabelo encaracolado e rebelde, agora tinha o cabelo muito curto. Tinha rugas à volta dos olhos e da boca, e a barba por fazer.

Quando o vira pela última vez, Jack só fazia a barba de vez em quando… naquela manhã do seu décimo oitavo aniversário, mesmo antes de se ir embora de Carlisle, sem prévio aviso e sem olhar para trás.

Sem sequer se despedir dela.

Antes de reparar no que estava a fazer, Geórgia deixou a sua chávena de chocolate sobre a mesa mais próxima e estendeu a mão para lhe acariciar a face, tal como fizera no dia em que o conhecera. Não sabia porque é que fizera aquilo. De alguma forma, era como se os anos passados tivessem desaparecido e fosse outra vez aquela menina de catorze anos, a olhar pela primeira vez para Jack.

Jack fechou os olhos quando ela o acariciou com tanta ternura. Aquele gesto estivera quase para lhe causar a sua perdição. «É mais difícil do que pensei voltar a ver Geórgia, passado este tempo», pensou. Tinha ansiado voltar a vê-la nem que fosse só por um dia ou uma hora, o suficiente para que lhe pudesse contar tudo o que desejara dizer-lhe, quando não tivera a oportunidade de o fazer.

Arrependera-se de não se ter despedido dela. Durante todos aqueles anos, nunca se reconciliara com os seus sentimentos em relação a Geórgia. Principalmente porque nunca chegara a compreendê-los.

Quando Jack saiu de Carlisle, Geórgia era uma menina magra, difícil, de quinze anos, com medo da vida. Nunca sentira uma mínima inclinação sexual por ela; naquele tempo era demasiado jovem para isso. Afecto, sim. E talvez a tivesse amado de alguma forma. Para Geórgia, ele fora o seu amigo, o seu confidente, o seu refúgio… Jack nunca pensara que poderia ser outra coisa.