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Editado por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

© 2006 Joan Wolf. Todos os direitos reservados.

A RENDIÇÃO DE UMA DAMA, Nº 239 - novembro 2011

Título original: His Lordship’s Desire

Publicada originalmente por Mira books, Ontario, Canadá

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

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I.S.B.N.: 978-84-9000-977-2

Editor responsável: Luis Pugni

ePub: Publidisa

Um

Sobre as colinas de Berkshire, a oito quilómetros a norte de Lambourn, Standish Court emergiu por entre a neblina diante dos olhos de Alexander Devize. Alexander já não ia a casa há três anos e a visão do edifício enorme de tijolo vermelho que se erguia diante dos seus olhos provocou-lhe um nó no estômago. Quando abandonara a sua casa, três anos antes, o seu pai ainda era vivo e tomava conta das terras. Três anos depois, Alex voltava como conde de Standish e duvidava que estivesse preparado para assumir a responsabilidade da sua nova condição. Levaria algum tempo a habituar-se à mudança, a passar do caos do campo de batalha para a serenidade das terras que se estendiam diante dele.

A carruagem parou junto da escada que levava à porta principal e começou a subir lentamente os degraus para a casa. Levantou a aldraba da porta e bateu três vezes.

Um criado jovem e musculado abriu a porta sem demora e levantou educadamente o olhar para ele.

– Senhor, em que posso ajudá-lo?

Alex tinha aberto a boca para se identificar quando a voz de um idoso exclamou atrás do lacaio:

– Estúpido! É o senhor!

Henrys, que era mordomo dos Devize desde que Alex se lembrava, afastou o jovem do seu caminho e disse, com voz trémula:

– Senhor, senhor, fico muito contente por o ver novamente em casa.

Alex agarrou a mão do idoso.

– É magnífico estar aqui, Henrys. Espero que a minha chegada não represente um problema demasiado grande para ninguém.

– Absolutamente, senhor. Absolutamente. A senhora vai ter uma grande alegria ao vê-lo. Neste momento, encontra-se com a senhora Sherwood na sala amarela. Quer entrar para as ver ou deseja que anuncie a sua presença?

– Irei sozinho, Henrys – indicou a porta. – Deixei a carruagem junto das escadas. Podes certificar-te de que se encarreguem dela?

– É claro, senhor. Encarregar-me-ei imediatamente disso.

Alex tirou o chapéu, libertando os caracóis pretos que escondia, e avançou lentamente para o hall. Atravessou o arco com o qual o seu pai pretendera recrear o Arco de Constantino, em Roma, e avançou para o que era o centro da casa, uma sala circular enorme com uma cúpula no tecto, sob a qual se alinhavam vinte colunas coríntias esculpidas em mármore verde. O chão também era de mármore e as paredes estavam decoradas com pinturas monocromáticas que representavam cenas militares e rituais de sacrifícios.

O pai de Alex desenhara aquela sala com a intenção de provocar a surpresa e a admiração daqueles que a vissem, e, certamente, cumpria o seu papel. Alex ficou a olhar para ela durante alguns segundos e avançou para a direita, em direcção à escada que o levaria ao primeiro andar.

Uma vez lá em cima, atravessou a sala principal, decorada com um tecto magnífico de estuque, obra de Joseph Rose, e uma tapeçaria de desenho intrincado de Thomas Witty. Atravessando a sala de música, com as suas paredes azuis e mobiliário Chippendale, acedia-se à sala amarela, uma divisão mais pequena com vista para a parte da frente e para a zona oeste da casa.

As duas mulheres estavam sentadas em poltronas orientais, com uma mesa de apoio entre elas. Ambas seguravam as chávenas frágeis de porcelana nas mãos. Alex fixou o olhar numa mulher de cabelo loiro grisalho, apanhado num coque.

– Olá, mamã. Voltei.

Lady Standish levantou o olhar para ele e deixou cair a chávena sobre o tapete persa.

– Alex? Meu Deus, és mesmo tu?

– Sim, mamã – sorriu. – Lamento ter-te assustado.

– Estás em casa! – exclamou lady Standish. Levantou-se e estendeu-lhe os braços. – Estás em casa!

Alex envolveu-a num abraço enorme.

– Sim, mamã, estou em casa – respondeu. – E não deverias surpreender-te tanto. Escreveste-me a dizer que precisavas de mim – deu-lhe um beijo na face. – Cheiras muito bem.

– No ano passado, quando o teu pai morreu, pensava que viesses sem a necessidade de to pedir – afirmou lady Standish, num tom ligeiramente acusador.

– Estávamos a meio da campanha para expulsar os franceses de Espanha, mamã. Agora que o conseguimos, compreendi que deixara de ser preciso no Exército e é por isso que estou aqui.

Lady Standish suspirou.

– Bom, já não farei mais reprovações – virou-se para a mulher que estava sentada ao seu lado. – Louisa, não é maravilhoso que Alex tenha regressado a casa?

Louisa Sherwood, prima de lady Standish, assentiu.

– Fico muito feliz por voltar a ver-te, Alex. Sentimos a tua falta.

Lady Standish voltou a sentar-se.

– Toca a sineta, Alex, quero que limpem esta nódoa de chá. Queres beber chá connosco? Ou preferes, talvez, um copo de xerez?

Alex sorriu.

– Beberei um chá, mamã – sentou-se numa cadeira oriental. – Estão a desfrutar de uma tarde tranquila de domingo?

– Sim. As raparigas foram andar a cavalo e levaram as meninas com elas, portanto, finalmente temos tempo só para nós.

A criada entrou na sala.

– Clarence – chamou-a lady Standish, – traz-nos mais chá. E volta depois para limpar esta nódoa.

– Sim, senhora – respondeu a criada.

Quando a criada saiu da sala, lady Standish virou-se para o filho.

– Amadureceste, Alex. Da última vez que te vi, eras uma criança. E, agora, és um homem.

– Sim, bom, a guerra tem esse efeito, mamã – tornou-se sério.

– Estive prestes a morrer quando descobri que te tinham ferido em Vitória. Estava convencida de que regressarias a casa para recuperar.

– Era uma ferida superficial, mamã. Escrevi-to numa carta. E cicatrizou muito rapidamente.

A criada regressou com uma bandeja com chá e uma chávena. Enquanto limpava o tapete, lady Standish serviu o chá ao seu filho.

Alex pegou na chávena e virou-se educadamente para a senhora Sherwood.

– Como estás, prima Louisa? Tens muito bom aspecto.

Louisa Sherwood, uma mulher muito atraente, sorriu, agradada.

– Estou muito bem, obrigada, Alex.

Alex olhou novamente para a mãe.

– Agora, diz-me, quais foram as pressões que te levaram a reclamar a minha presença com tanta urgência?

O semblante de lady Standish tornou-se sério.

– A nossa propriedade permaneceu durante um ano nas mãos do nosso administrador e acho que já está na hora de que alguém verifique o que anda a fazer. Disse-me que as casas do rio precisam de reparações no telhado, mas não quero autorizar um desembolso de tal envergadura sem contar com a tua aprovação. E este não é o único assunto pendente. Já estava na hora de regressares a casa, Alex.

Alex pensou que a mãe, que vivera em Standish Court enquanto ele estava fora, deveria saber melhor do que ele se era realmente necessário ou não arranjar os telhados, mas não o disse. Limitou-se a assentir e bebeu outro gole de chá.

– Também preciso da tua ajuda noutro assunto – continuou lady Standish. – Quero apresentar Sally à sociedade esta temporada e a filha de Louisa, Diana, fará a sua apresentação juntamente com ela – «Sally» era a alcunha familiar de lady Sarah, a irmã mais velha de Alex. – Será muito mais agradável para todas nós se dispusermos de um cavalheiro que nos acompanhe.

Alex pousou a chávena na mesa.

– Dee já tem vinte anos – respondeu. – Ainda não se apresentou à sociedade?

– Bom, como é claro, já fez algumas saídas nesta zona. E também lhe fizeram algumas propostas. Mas rejeitou-as todas, por isso, decidi que, quando levasse Sally a Londres, Diana poderia vir connosco.

– Uma oferta que apreciámos sinceramente – disse a senhora Sherwood, com suavidade.

Lady Standish deu-lhe uma palmadinha na mão.

– Jamais esquecerei o bem que Diana fez a Sally durante o ano que esteve tão doente. E eu adorarei contar com a companhia dela.

As duas mulheres sorriram.

– E estás a pedir-me que acompanhe Dee e Sally a Londres durante a temporada de baile? – perguntou Alex. – O que é isto? Uma expedição à caça de marido? – Alex ficou com a voz ligeiramente tensa.

– É claro – respondeu a mãe. – Esse é o único motivo pelo qual uma jovem faz uma apresentação à sociedade.

Naquele momento, abriu-se a porta da sala e uma jovem de caracóis acobreados e capa de montar irrompeu na sala.

– Lamento ter de lhe dizer isto, prima Amelia, mas Maria caiu do pónei e receio que tenha partido a clavícula. Está a chamá-la. Pode vir?

Lady Standish levantou-se rapidamente.

– É claro que sim. O que aconteceu?

– Um veado atravessou-se no nosso caminho e Candy assustou-se. Lamento imenso, prima Amélia. Foi tudo tão rápido que não pudemos fazer nada.

– Já mandaste chamar o médico? – perguntou lady Standish, da porta.

– Sim, pedi a um dos empregados dos estábulos que fosse buscá-lo.

– Oh, querida... – gemeu lady Standish. – Não sei o que se passa com aquela menina, mas anda sempre a meter-se em problemas.

A porta fechou-se atrás dela.

Alex, que se tinha levantado assim que Diana entrara na sala, cumprimentou-a:

– Olá, Dee. É bom voltar a ver-te.

A jovem virou os seus olhos escuros para ele. Alguma coisa relampejou nas suas profundezas, mas desapareceu quase imediatamente. Pousou a mão nas costas do sofá.

– Olá, Alex – cumprimentou-o. Fez uma pausa. – Ou devo chamar-te «senhor»?

Alex sentiu que corava.

– Para ti, serei sempre Alex. E sabes bem disso.

Dee arqueou uma das suas sobrancelhas perfeitamente desenhadas.

– Ah, sim?

– Sim ou, pelo menos, deverias sabê-lo – conseguiu responder Alex, com firmeza.

Diana encolheu os ombros com um movimento gracioso.

– Fico feliz por teres voltado finalmente para casa. A tua mãe precisava de ti. Standish Court é uma propriedade muito grande.

Olhava para ele com frieza e Alex não estava habituado àquela atitude da parte de Diana.

– Tenho consciência disso. Foi por esse motivo que regressei.

– De qualquer forma, a guerra já acabou, não é verdade?

– Sim. Os aliados estão prestes a entrar em Paris e Napoleão terá de assinar a acta de rendição em breve.

Diana deixou de lhe prestar atenção para se virar para a sua mãe.

– Acho que vou voltar para os estábulos para ver como está Candy, mamã. Não parecia ter-se magoado, mas quero ter a certeza.

– Eu acompanho-te – ofereceu-se Alex, rapidamente. – Gostava de ver que cavalos tens. Monty ainda está aqui, não está?

– É claro. De facto, estive a montá-lo, portanto, está numa forma excelente.

Alex virou-se para a senhora Sherwood.

– Dá-nos licença, senhora?

A senhora Sherwood olhou para a sua filha e, depois, olhou para ele.

– É claro – respondeu, depois de uma pausa quase imperceptível. – Quando acabarem, volta para casa, Diana. Quero acabar de fazer as provas do vestido novo.

– Está bem, mamã – disse Diana e os dois jovens viraram-se para a porta.

Não trocaram uma única palavra enquanto desciam as escadas e se dirigiam para a porta mais próxima dos estábulos. O jardim estava ermo depois do Inverno e a fonte de ninfas e querubins igualmente seca. O caminho até aos estábulos atravessava o jardim, a seguir ao qual se erguiam os estábulos de tijolo e o picadeiro, rodeado de um muro de pedra.

Alex quebrou o silêncio quando entravam nos estábulos.

– Escrevi-te muitas vezes, mas não me respondeste. Não me escreveste uma única carta.

Diana levantou o queixo e continuou a caminhar.

– Esperavas que o fizesse? A escolha foi tua, Alex. Deixei-te muito claro que era o Exército ou eu e escolheste o Exército. Não fui eu quem pôs fim à nossa relação, foste tu.

Alex pousou a mão no seu braço, obrigando-a a parar.

– Disseste para me ir embora.

– Era evidente que querias ir, Alex. Eu limitei-me a dizer o que querias ouvir. Mas nunca disse que esperaria por ti.

– Mesmo assim, não te casaste.

Diana encolheu os ombros com um gesto muito típico dela.

– Não há ninguém por aqui com quem queira casar-me. Mas, no mês que vem, farei a minha apresentação à sociedade juntamente com Sally e espero que ambas possamos encontrar em Londres um marido que nos convenha.

Alex agarrou-a pelo braço.

– Pensei muito durante todo o tempo que estive fora. Senti a tua falta, Dee. Era o que te dizia nas minhas cartas.

– Nunca as li – respondeu Dee.

Libertou-se dele e continuou a andar. Um homem de uns trinta anos, alto e de ombros largos, estava a segurar um dos cavalos junto da parede do estábulo. Ao ver Alex, esboçou um sorriso enorme.

– Senhor – cumprimentou-o, – voltou para casa!

Alex obrigou-se a sorrir e aproximou-se do responsável pelas cavalariças.

– Sim, Henley. Voltei para ficar. Como estás? Tens bom aspecto.

– Estou muito bem, obrigado, senhor. Preocupámo-nos muito consigo quando descobrimos que fora ferido.

– Não foi nada – respondeu Alex. – A ferida sarou muito depressa. A menina Sherwood veio ver o pónei que atirou a minha irmã ao chão e eu vim dar uma olhadela aos cavalos.

Henley chamou um dos empregados e passou-lhe o cavalo que estava a segurar.

– Monty está em plena forma – disse. – A menina Diana manteve-o em forma para quando regressasse.

– Porque não dás uma volta com o senhor pelos estábulos enquanto eu vou ver Candy? – sugeriu Diana.

– Óptimo! – respondeu Henley, com entusiasmo.

Alex olhou para Diana, mas ela já tinha desviado o olhar.

– Não fizemos muitas mudanças desde a morte do seu pai – explicou Henley, enquanto avançavam pelo corredor, contemplando as quadras espaçosas dos estábulos. – Continuamos a ter dois cavalos de caça e o senhor James e o senhor Jeremy montam-nos quando voltam da escola. Os rapazes também fazem exercício com eles e a menina Diana leva-os de vez em quando, e fá-los saltar. Esta é Annie, a égua da menina Diana.

Alex aproximou-se da quadra e viu uma égua zaina, alta e magra. Na realidade, Annie não era propriedade de Diana. O pai de Alex tinha-a comprado a um homem que a maltratava e permitira que Diana a montasse, pois considerava que a égua não era suficientemente boa para nenhum dos seus filhos.

– Já deve ter muitos anos – comentou Alex.

– Na verdade, está praticamente reformada – respondeu Henley. – A menina Diana tem montado Monty ultimamente. Como é claro, agora que voltou para casa...

– Trouxe um cavalo – interrompeu-o Alex, – que montava em Espanha. Não há nenhum motivo para que a menina Diana tenha de deixar de montar Monty.

Henley sorriu, radiante. Ele sempre adorara Diana.

– Qualquer pessoa diria que aquele cavalo é demasiado grande para ela, mas a verdade é que é canja para ela. Acho que a menina Diana seria capaz de montar qualquer cavalo.

Pararam à frente de uma quadra que albergava um cavalo castrado castanho, que se aproximou para os cumprimentar.

– Este é novo – disse Alex.

– É da menina Sarah. Um cavalo com muito bom feitio.

Continuaram a avançar pelo corredor. Viram os cavalos das carruagens e os póneis de Maria e de Margaret, as irmãs mais novas de Alex. Diana estava a ver um dos póneis e saiu da quadra assim que se aproximaram.

– Não tem nada – comentou. – Tinha medo de que estivesse magoado, mas parece que está bem.

– É um pónei muito batalhador – disse Henley. – Se calhar, é demasiado grande para lady Maria.

– É novo – disse Alex.

– Maria já era demasiado alta para o seu antigo pónei e comprámos-lhe este há alguns meses – disse Diana. – Quando fui vê-la, parecia uma égua muito tranquila, mas, ultimamente, assusta-se com tudo.

– Qualquer cavalo se teria assustado ao cruzar-se com um veado – comentou Alex.

– Isso é verdade – respondeu Diana. – Mas houve outras vezes em que...

– Lembras-te do pónei diabólico que eu tinha? – perguntou Alex.

Pela primeira vez, apareceu um sorriso ténue nos lábios de Diana.

– Adorava-o porque era capaz de transpor qualquer obstáculo.

– E também de atirar qualquer um ao chão.

O sorriso desapareceu dos lábios de Diana.

– Espero que os cavalos que comprámos tenham a tua aprovação.

– A menina Diana encarregou-se das cavalariças depois da morte do seu pai, senhor – explicou Henley.

– Vejo que devo agradecer-te, Dee – disse Alex. – Agradeço-te pelo tempo e pelo esforço dedicados.

– Não foi nada – respondeu ela. – Agora, suponho que seja melhor voltar para casa para ver o que aconteceu à pobre Maria.

Dirigiu-se a passos largos para a porta. Alex permaneceu onde estava, observando a sua figura esbelta coberta por uma saia de montar e um casaco de lã. O seu cabelo loiro-avermelhado parecia reflectir toda a luz dos estábulos.

Depois de a contemplar durante alguns segundos, seguiu-a.

Dois

Efectivamente, Maria partira a clavícula. Alex inclinou-se para beijar a sua irmã de dez anos e compadecer-se dela.

– Alguma vez partiste a clavícula? – perguntou a menina.

– Não, mas uma vez parti um braço.

– Ao cair de um cavalo?

– Sim, o meu pónei atirou-me ao chão.

– Acho que Candy não gosta de mim – disse Maria. – Salta por tudo e por nada.

– Então, teremos de te arranjar outro pónei – propôs Alex, imediatamente.

– Quando a experimentei era muito boa. Só começou a assustar-se quando veio cá para casa.

– Então, não é o pónei adequado para ti – respondeu Alex. – Arranjaremos outro em que possas confiar.

– Obrigada, Alex – respondeu Maria, com um sorriso.

– Maria precisa de um pónei como o meu Basil – propôs Margaret, a outra irmã de Alex, uma menina de doze anos. – Basil é muito seguro.

– Veremos o que conseguimos encontrar – respondeu ele.

Alex, Diana, Sally e Margaret estavam no quarto de Maria. Esta última estava na cama, onde lady Standish tinha insistido em que ficasse durante o resto da tarde. Tinha o braço esquerdo ao peito.

– Pelo menos, foi o braço esquerdo – disse Margaret.

– Sim – respondeu Maria, encolhendo os ombros com desânimo. – Jeremy vai rir-se quando descobrir que caí e parti a clavícula.

Jeremy era irmão de Alex e estava a estudar em Eton.

– Não, não vai rir-se. Não o permitirei.

Maria olhou, esperançada, para o irmão mais velho.

– A sério?

– A sério.

– Fico tão feliz por estares em casa, Alex... – disse Maria, com um sorriso.

– E eu também estou feliz por estar em casa – respondeu ele.

– Agora, acho que devíamos sair e deixar Maria descansar – propôs Sally.

Diana foi a primeira a dirigir-se para a porta. Sally seguiu-a. Alex saiu em último lugar e fechou a porta com delicadeza. Uma vez no corredor, Sally olhou para ele a sorrir.

– Alegramo-nos muito por teres voltado para casa e por estares bem – disse-lhe.

– E eu por ter voltado – respondeu Alex, talvez pela décima vez naquele dia.

– A mamã contou-te que Diana e eu vamos fazer a nossa apresentação à sociedade no mês que vem? – perguntou-lhe Sally.

– Sim, contou.

– Tu podes ser o nosso acompanhante, Alex. Se calhar, também encontras uma rapariga com quem possas casar-te.

Alex olhou para Diana.

– Se calhar – respondeu.

Naquela noite, o jantar foi uma festa. Foi um jantar de boas-vindas a Alex e permitiram que tanto Margaret como Maria se sentassem à mesa com o resto da família. Diana e a mãe também estiveram presentes. Lady Standish explicou ao filho que, depois da morte do pai, convidava a sua prima Louisa e a filha a juntarem-se a eles à noite.

– Teria sido demasiado triste se Diana e eu estivéssemos sozinhas.

A senhora Sherwood e a filha viviam há dezoito anos numa casa que ficava dentro da propriedade dos Standish. Lady Standish convidara a prima a ocupar aquela casa quando o marido fora chamado para servir o Exército na Índia. Com o tempo, o senhor Sherwood alcançara a patente de coronel e, pouco tempo depois, tivera de se mudar para a Península Ibérica, acabando por morrer na Batalha da Corunha.

Os Sherwood não tinham o mesmo estatuto económico e social que os condes de Standish, mas, como as duas primas eram amigas íntimas, participavam com frequência nas actividades do seu círculo. O conde fora sempre muito tolerante com a prima da sua mulher, mas era muito mais consciente do fosso que separava as duas famílias do que a sua esposa. Ambas as mulheres sabiam que, se o conde fosse vivo, não teria permitido que Diana se apresentasse à sociedade com Sally.

De modo que, naquela noite, Alex estava sentado à mesa com seis mulheres. Era uma mudança notável para um homem que tinha passado os últimos três anos da sua vida na companhia quase exclusiva de homens.

– Tens de te sentar com Billings para reverem os livros de contabilidade – disse lady Sherwood ao filho, enquanto lhes serviam a sopa. – Acho que é um bom homem, mas o teu pai era muito escrupuloso com as contas. Além disso, ouvi dizer que é preciso fazer alguma coisa com a propriedade de Derbyshire.

«A minha vida vai mudar tanto», pensou Alex. Desde criança, sempre sonhara ser soldado. Mas aquele sonho acabara e, a partir daquele momento, tornar-se-ia conde. Percorreu com o olhar aquela sala tão familiar e, ao mesmo tempo, tão estranha. E olhou novamente para a sua mãe.

– Falarei com ele, mamã – comprometeu-se.

Lady Standish sorriu, agradecida.

– Não sabes como estou feliz por teres voltado para casa, meu filho.

– Alex disse que me comprará um pónei novo, mamã – disse Maria. – Candy é demasiado perigosa.

– Óptimo, óptimo – respondeu lady Standish. – Não podemos permitir que te parta os ossos todos, Maria.

– O que achas que irá acontecer em França, Alex? – interessou-se a senhora Sherwood.

Alex olhou para ela. Continuava a ser uma mulher muito atraente, mas nunca fora tão bela como a filha.

– Temos Napoleão cercado – respondeu. – Vai ter de abdicar.

– Isso significa que o rei voltará a ocupar o trono? – perguntou Diana.

Alex virou-se para ela. Diana estava vestida com um vestido de noite cor de marfim que realçava a brancura sem mácula da sua pele. Dava-lhe prazer o simples facto de olhar para ela. Diana era inclusive mais bonita do que a imagem que levara dela no coração durante aqueles três anos.

– O rei Luís esperou pacientemente pela sua oportunidade em Inglaterra durante muito tempo.

– Bom, espero que sejam capazes de formar um governo mais parecido com o nosso, com um parlamento que conceda algum poder ao povo – interveio Diana. – Seria uma pena para a França ter passado por tudo isto para acabar sob o domínio dos Bourbon outra vez.

Alex sorriu.

– Continuas a ser uma revolucionária, não é, Dee?

– Eu não consideraria revolucionário desejar um governo parlamentar – respondeu Diana, muito séria.

– Não creio que a França volte a ser a mesma. É evidente que a Revolução deixou a sua marca – respondeu Alex.

– Uma coisa que considero positiva – respondeu Diana, decidida.

– Quando devemos ir para Londres, mamã? – perguntou Sally.

– Eu gostaria que celebrássemos o nosso baile no fim de Abril – respondeu lady Standish. – Isso significa que teremos de estar em Londres várias semanas antes para o organizar.

Sally sorriu. Era uma jovem de caracóis dourados e olhos azuis como os de Alex.

– Vai ser muito divertido, não é verdade, Diana?

Diana devolveu-lhe o sorriso.

– Sim, claro que sim.

– Que história é essa de organizar um baile? – perguntou Alex.

– Temos de organizar um baile para apresentar as raparigas à sociedade – esclareceu a sua mãe. – Tu serás o anfitrião, é claro.

– Eu não sei como funciona isso, mamã – franziu o sobrolho. – Estive longe daqui durante três anos, a lutar na guerra. Não percebo nada de bailes.

– Não tens de saber nada – garantiu a mãe. – Louisa e eu encarregar-nos-emos de tudo. A única coisa que terás de fazer será estar presente e receber os convidados connosco. Ah, e dançar com Diana e com Sally! E com todas as raparigas que puderes.

Alex continuava com o sobrolho franzido.

– Quando me pediste que regressasse a casa, não sabia que ias arrastar-me para o redemoinho da vida social londrina.

– É o lugar que te corresponde ocupar – replicou a mãe. – Agora, és o chefe da família, Alex. Tens de assumir as tuas responsabilidades.

«E tenho consciência disso», pensou, com tristeza. O que não sabia era que uma das suas responsabilidades consistia em ajudar Diana a encontrar um marido.

A semana seguinte foi um redemoinho de actividade para Alex. O administrador, John Billings, percorreu com ele todas as suas propriedades e mostrou-lhe tudo aquilo de que devia ocupar-se. O seu banqueiro chegou de Londres e passou muitas horas com ele, a rever os seus activos e as suas dívidas.

O falecido senhor Standish fora um homem prudente e a propriedade estava numa situação económica excelente. A sua mãe dispunha de uma pensão e do usufruto da casa enquanto assim desejasse. Os seus irmãos eram responsabilidade de Alex, mas havia dinheiro mais do que suficiente para financiar a educação dos rapazes e a apresentação das raparigas à sociedade. De facto, Alex era um homem muito rico.

Alex foi também a Oxford e a Eton para visitar os seus irmãos mais novos, os quais arranjaram maneira de lhe sacar dez libras cada um.

No fim da semana, toda a família se sentia tão cómoda com Alex como se ele nunca tivesse partido. Toda, excepto Diana.

Alex tentara ficar a sós com ela em inúmeras ocasiões, mas Diana não colaborava. Não quisera dar um passeio pelo lago com ele, nem aceitara acompanhá-lo a procurar um novo pónei para Maria. Era frustrante.

Como é claro, não ajudava absolutamente nada que estivesse tão atraente. Quando a via, Alex desejava abraçá-la e beijá-la até a deixar sem fôlego. No entanto, tinha cada vez mais claro que um gesto desses só serviria para piorar as coisas entre eles.

Uma tarde em que estavam sentadas na sala amarela, a falar sobre as últimas tendências da moda, Sally perguntou de repente a Diana:

– Porque estás tão zangada com Alex?

Diana ficou sobressaltada ao ouvi-la.

– Não estou zangada. De onde tiraste essa ideia?

– Bom, és muito áspera com Alex, disso tenho a certeza. E ele está a tentar ser amável contigo. Não é natural que sejas tão pouco amável, Diana. E menos ainda com Alex.

– Mas sou amável – replicou Diana à defesa.

Mas não era capaz de enfrentar o olhar sincero de Sally, portanto, continuou a folhear a revista.

– Não, não é verdade. Olha para mim, Diana. O que se passa?

Diana levantou o olhar. Os seus olhos castanhos encontraram-se com os olhos de Sally, uns olhos azuis como o céu. As duas jovens eram muito amigas e era difícil para Diana mentir.

– Não se passa nada – respondeu, com resolução. – É imaginação tua, Sally. Agora, tenho a cabeça noutras coisas, não em Alex. Estou muito entusiasmada com a nossa apresentação em Londres.

Um rubor delicado cobriu as faces de Sally. Era uma rapariga adorável, a imagem de uma adolescente encantadora prestes a tornar-se uma mulher. No ano anterior, tinham-lhe permitido ir a duas reuniões locais e a uma festa onde conhecera outros jovens, mas aquela experiência limitada não contribuíra para lhe dar um ar de sofisticação.

– Eu também estou entusiasmada – respondeu. – Será tão diferente da nossa vida em Standish Court...

– Sim, eu sei – disse Diana. Tentou concentrar-se na sua visita iminente a Londres. – A prima Amélia disse que há lugares onde pode andar-se a cavalo. Evidentemente, Hyde Park é uma zona muito frequentada. Precisaremos de cavalos. Pergunto-me se Alex já saberá qual pensa montar.

– Pergunta-lhe – respondeu Sally. – Se não puderes montar, vais ficar deprimida.

– Eu sei.

– Então, pergunta-lhe. Já sabes que a minha mãe delega em Alex tudo o que está relacionado com os cavalos. Descobre o que pensa fazer.

Horas depois, Diana teve oportunidade de fazer aquela pergunta importante a Alex. Encontraram-se nas cavalariças. Diana estava a treinar Candy quando chegou uma carruagem com um cavalo preto-azeviche atado à parte de trás da carruagem. Diana recolher parte da corda com que segurava Candy e aproximou-se para contemplar aquele animal que olhava serenamente à sua volta.

Era um exemplar grande, com o pescoço arqueado, o lombo curto e patas de aspecto forte.

Henley saiu do estábulo e aproximou-se do cavalo.

– Este deve ser o cavalo que o senhor utilizava na Península Ibérica – comentou ao cocheiro da carruagem.

– Exacto. Este é Black Bart. Trouxe-o de Bordéus.

– Mandarei alguém à casa para avisar o senhor – disse Henley.

Enquanto esperavam por Alex, Diana apresentou-se a Black Bart. Ele comeu o bocado de cenoura que lhe ofereceu e levantou com entusiasmo as orelhas quando começou a falar com ele. Uma vez apresentados, Diana foi palpar-lhe as patas.

– Bart! – era Alex. – Como estás, velho amigo? Senti a tua falta.

O cavalo relinchou suavemente ao reconhecer aquela voz. Alex aproximou-se para o acariciar.

– É um cavalo lindo, Alex – elogiou Diana.

Alex virou-se para ela com um sorriso.

– Salvou-me a pele várias vezes, podes ter a certeza. Contrariamente a muitos outros cavalos que se limitavam a galopar sem nenhum tipo de controlo, Bart ouvia-me sempre – virou-se para o cavalo. – És um bom tipo, não é verdade, amigo?

Bart levantou a cabeça em resposta.

Alex virou-se para Henley.

– A quadra já está pronta?

– Sim, senhor. Já está pronta há vários dias.

O sol fazia cintilar tanto as crinas pretas do animal como o cabelo escuro de Alex enquanto ele puxava a corda que atara o cavalo à carruagem e começava a conduzi-lo para os estábulos.

Diana seguiu-os.

Assim que Bart ficou instalado junto de um balde de água fresca e de uma ração de feno, Alex afastou-se da porta e, pela primeira vez, pareceu reparar na presença de Diana.

– Gostas dele, Diana? – perguntou-lhe.

– Sim, muito – Diana começou a sair dos estábulos com ele. – Já decidiste que cavalos vais levar para Londres?

Tinham atravessado o picadeiro e caminhavam para a casa.

– Terei de levar os cavalos para a carruagem, é claro. E mais dois para Sally e tu montarem. E, para mim, levo Bart.

– Achas que posso levar Monty? – perguntou Diana, hesitante. – Annie está praticamente reformada. Tem quase sempre alguma lesão.

– Monty é um cavalo bom para andar no campo, mas não sei como se comportará na cidade, com tanto trânsito.

– Tenho a certeza de que se comportará bem – disse Diana.

– Talvez seja melhor comprar um cavalo habituado a Londres. Posso sempre ir ao Tattersall’s e procurar um bom.

– Preferia levar Monty – insistiu Diana. – Desde que partiste, monto-o quase todos os dias.

Alex parou e observou-a com o sobrolho ligeiramente franzido.

– Portanto, ficaste com o meu cavalo, não foi?

– Tu deixaste-o aqui – respondeu Diana, apertando os seus lábios bonitos. – Não parecias importar-te com o que pudesse acontecer-lhe.

Alex continuou a olhar para ela em silêncio. Ao fim de alguns segundos, virou-se e recomeçou a andar.

– Deixei-o nas cavalariças do meu pai, onde todos os cavalos são bem cuidados. Não tinha medo de que estivesse a ser maltratado. Além disso, sabia através de Sally que o montavas.

«É uma tolice zangar-me com ele», pensou Diana. Sobretudo, quando estava a pedir-lhe um favor.

– Monty é como se fosse o meu próprio cavalo – insistiu, com voz mais doce. – Por favor, Alex, se não quiseres levá-lo para ti, leva-o para que possa montá-lo. Estou desejosa de ir para Londres, mas sei que, se não puder montar, serei muito infeliz.

– Muito bem – respondeu Alex, bruscamente. – Levarei Monty.

Diana suspirou.

– Obrigada – agradeceu.

Alex assentiu e seguiram o seu caminho. Depois de um minuto de silêncio, Alex advertiu-a:

– Não precisas de ir a Londres procurar marido, sabes disso. Podes casar-te comigo.

Diana tinha passado toda a sua adolescência a pensar que se casaria com Alex. Mas isso mudara há três anos.

– Agradeço-te muito, Alex – respondeu, num tom de voz completamente inexpressivo. – Mas já é demasiado tarde.

– Só tens vinte anos e eu, vinte e um! Como pode ser demasiado tarde?

O aborrecimento e a dor do abandono buliam no interior de Diana e, daquela vez, não fez nenhum esforço para os conter. Virou-se para ele, furiosa.

– Foi demasiado tarde a partir do momento em que tomaste a decisão de te alistares no Exército! – exclamou. – Naquele dia, mataste tudo o que sentia por ti.

Alex agarrou-a pelo braço e segurou-a à frente dele.

– Custa-me a acreditar que isso seja verdade.

Diana fixou o olhar na sua mão. Alex foi abrindo lentamente os dedos e largou-a.

– É bom que acredites – disse-lhe Diana, – porque é a verdade.

Três

Já tinham passado vários dias desde que o choque de voltar a ver Alex fizera com que Diana se sobressaltasse cada vez que se encontravam. Quando lhe chamava Dee, um nome que mais ninguém utilizava, encarava-o como um símbolo de tudo o que os tinha unido.

Mas, à medida que o tempo ia passando, viu que era cada vez mais fácil endurecer diante dele. Alex estava muito ocupado com as suas propriedades e, normalmente, só o via à hora de jantar. Rodeada do resto da família, não lhe era difícil mostrar-se fria e composta, fingir que era indiferente a ele.

E queria sê-lo. Fosse o que fosse que tivesse existido entre eles, tinha desaparecido de forma irrevogável há três anos. Diana estava firmemente convencida disso. O que sentira então e tudo o que lhe tinha acontecido após a partida dele abrira um abismo entre ambos que jamais poderiam ultrapassar.

Alex tinha-lhe mostrado a pouca importância que tinha para ele. E, no entanto, ao regressar a casa, pensava que tinha o direito de retomar as coisas onde as tinham deixado. Pois, não era assim. Diana não precisava dele. Não precisava de se casar com um conde endinheirado. Ela queria casar-se com um homem com dinheiro suficiente para viver comodamente, um homem no qual pudesse confiar e que fosse um bom pai para os seus filhos. Um homem que estivesse ao seu lado quando precisasse. Não alguém como Alex.

Diana era perfeitamente consciente de que a sua mãe e ela viviam no limite da pobreza. Se lady Standish não lhes tivesse proporcionado uma casa e um certo prestígio social, teria crescido num quarto arrendado de uma cidade como Bath. O seu pai era o filho mais jovem de um escudeiro e o único rendimento procedia do pagamento que recebia do Exército. Depois da morte do seu pai, a sua mãe e ela viviam de uma pensão minúscula e complementavam os seus rendimentos com o dinheiro que a senhora Sherwood ganhava a dar aulas de piano a meninas da zona. Graças à relação de Louisa Sherwood com lady Standish, Diana tinha oportunidade de andar a cavalo e de ir a festas.

Por tudo isso, ter a oportunidade de se apresentar à sociedade em Londres era uma bênção para ela. Sabia que tinha de se casar. A ideia de passar o resto da sua vida a depender da generosidade de Alex fazia-a tremer. Também sabia que, para uma jovem sem dinheiro como ela, não seria fácil conseguir um bom casamento. Mas tinha consciência da sua beleza e pensava que em toda a cidade de Londres teria de haver pelo menos um bom homem a quem bastasse a sua beleza e a sua personalidade para querer casar-se com ela.

Sally atrairia condes e viscondes. Diana não se enganava ao esperar aquele tipo de atenção. O que queria era um homem bom e uma casa no campo com cães, cavalos e crianças. Certamente, não era pedir demasiado.

Mas teria preferido que Alex não fosse com elas.

Várias semanas depois do regresso de Alex, recebera um convite da viscondessa Alston a solicitar a presença dos Devize e das Sherwood numa festa que se celebraria em Reeve House. Os Alston viviam a vários quilómetros de Standish Court e eram os vizinhos mais próximos com a sua posição social. O pai de Alex fora muito amigo do visconde e, quando ainda era vivo, as duas famílias viam-se com frequência. Lady Standish aceitou o convite em seu nome e em nome das Sherwood.

– Tenho a certeza de que querem ver-te – comentou lady Standish, quando comentaram a chegada do convite naquela noite, durante o jantar.

– Só seremos nós e os Alston? – perguntou Alex.

– Pelo bilhete que Phoebe nos enviou, deduzo que haja mais vizinhos da zona. Sabes que no campo não temos cerimónias excessivas, Alex. Tenho a certeza de que também irá o doutor Lawrence. E sir Burton Nable, certamente.

– Espero que Ned vá – disse Alex. – Tinha a intenção de ir vê-lo.

Ned, o filho de sir Burton, fora um grande amigo de Alex quando os dois eram mais jovens. Ned também tinha lutado na Península Ibérica, mas não tivera tanta sorte como Alex. Ele pertencia a um regimento de infantaria e tinha perdido a parte inferior da perna esquerda em Salamanca.

– Surpreender-me-ia se Ned não fosse – disse a senhora Sherwood. – Está noivo e prestes a casar-se, Alex. Lembras-te de Lizzie Carruthers?

– Sim. Meu Deus, Lizzie já tem idade para se casar?

– Tem dezoito anos, tal como eu – respondeu Sally.

– É curioso, mas, quando se está longe, imagina-se que todos continuem como os vimos da última vez – afirmou Alex, com o olhar fixo em Diana. – Não se imagina que possam mudar.

– Todos mudam – replicou Diana. – E três anos é muito tempo. Tenho a certeza de que aos vinte anos já não sou a mesma pessoa que era aos dezassete, quando tu te foste embora.

– Sim, já reparei.

Quando o jantar acabou, retiraram-se para o andar de cima, para a sala de música, onde Sally os entreteve ao piano. Tocava muito bem e o resto da família permaneceu em silêncio, ouvindo com prazer aquelas melodias de Mozart. Alex observava Diana, que estava sentada junto da sua mãe.

A curva das suas maçãs do rosto inspiravam-lhe uma grande doçura e os seus olhos, grandes e escuros no meio daquela cútis tão clara, eram fascinantes. Os seus lábios eram perfeitos, nem demasiado finos, nem demasiado grossos. Simplesmente, perfeitos.

Diana tinha razões para estar zangada com ele. Tivera de escolher entre ficar em casa com ela ou tornar realidade o sonho de se tornar soldado. E tinha escolhido a segunda hipótese. Aos dezanove anos, o seu fascínio pelo Exército fora muito mais forte do que o seu amor por ela.

Se soubesse então tudo o que tinha aprendido sobre a guerra, talvez não tivesse tomado a mesma decisão.

Diana virou-se para ele, como se tivesse sentido o peso do seu olhar. Durante um breve instante, alguma coisa intensa e poderosa pareceu explodir entre eles. Depois, Diana franziu o sobrolho, alisou a saia e voltou a olhar para Sally.

«Não lhe sou indiferente», pensou Alex, com o coração acelerado. «Diga o que disser, ainda resta algo do que houve noutros tempos entre nós. Tenho a certeza. Se calhar, ainda não está tudo perdido. Se tiver paciência suficiente...»

A música acabou e lady Standish disse à sua filha:

– Foi lindo, querida.

Sally virou-se no banco do piano e sorriu ao seu público. Todos aplaudiram.

– Agora, passemos à sala amarela para beber o chá – sugeriu lady Standish.

Na noite da festa dos Alston, lady Standish decidiu que deveriam ir todos na carruagem familiar dos Standish.

– Não há nenhum motivo para que tenhas de congelar numa carruagem aberta, Alex – disse ao seu filho. – Podes ir com Sally e Diana. Ao fim e ao cabo, não vamos para muito longe.

Alex gostou da ideia de ir com Diana, de modo que não lhe ocorreu nenhuma objecção à sugestão da sua mãe.

Foi assim que cinco pessoas acabaram reunidas à porta da casa, dispostas a entrar na carruagem elegante dos Standish. Lady Standish e a senhora Sherwood foram as primeiras a entrar, e sentaram-se num dos bancos laterais. Depois, lady Standish fez sinal ao seu filho para que entrasse.

Alex sentou-se à frente da sua mãe. Na rua, ouviu Sally a perguntar:

– Importas-te que me sente à janela, Diana? Sabes que tenho tendência para enjoar.

Depois de uma pausa evidente, Diana respondeu:

– É claro que não, Sally.

Alex observou Diana enquanto ela entrava na carruagem e se sentava à sua esquerda. Deixou um espaço considerável entre eles, mas, quando Sally se sentou, viu-se obrigada a aproximar-se dele.

Alex passou o braço pelas costas do banco, como se daquela maneira pudessem dispor de mais espaço. No interior da carruagem quase não entrava luz, mas podia sentir a proximidade de Diana em cada uma das suas células. Todo o seu corpo reagiu. Não estivera tão perto de Diana desde que regressara a casa.

– Bom, não se vai muito mal, pois não? – perguntou lady Standish, alegremente.

– Vamos muito bem, mamã – respondeu Sally.

Diana permanecia em silêncio.

Ao fim de alguns segundos, a carruagem arrancou.

– Ainda bem que a noite está tão limpa – comentou lady Standish. – Não gosto de andar de carruagem quando está a chover. Vou sempre com medo de que William acabe por sair da estrada. Está a ficar velho e acho que já não vê bem na escuridão.

– Meu Deus, mamã, porque tens um motorista que não vê bem à noite?

– O teu pai queria demiti-lo, mas a verdade é que não sou capaz de o fazer. Está connosco há tantos anos...

– Mas não pode manter o seu emprego se não consegue ver bem – disse Alex, tentando mostrar-se razoável. – Há uma casa vazia ao lado da casa onde vive a nossa antiga ama. Dar-lhe-ei uma pensão.

Lady Standish suspirou.

– Tens razão, é claro. Suponho que não quisesse fazer mais mudanças depois da morte do teu pai.

– Pobre William... – murmurou Diana, com pesar. – O que fará agora se não pode conduzir?

– Pode dedicar-se à pesca – respondeu Alex. – Ia sempre pescar quando tinha um dia livre. Quando eu era pequeno, ensinou-me vários truques de pesca. Encontraremos um homem mais jovem que o substitua, mamã – acrescentou Alex. – Ficarás mais descansada se estiver a conduzir alguém que não tenha tantas hipóteses de acabar com a carruagem na valeta.

– Obrigada, Alex – disse lady Standish.